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quinta-feira, 13 de abril de 2017

diálogos - (fragmento da próxima aventura do Pilha)

Diálogos: (Fragmento da próxima aventura do Pilha)

“Tu vai roubar, Pilha?” E eu fiquei mesmo assustado! A gente sempre aprontava, eu sei… mas aquilo era tão diferente…
“Que mané roubar nada! Vou pegar emprestada.”
“Mas tu tem camisa, Pillha”
“Preciso de uma bonita, nova!”
“Mas desde sempre a gente usa roupa velha e gosta!”
“Hoje não é sempre! Tem vez que a gente precisa de roupa nova pra ser gente!”
O Pilha tava sério. E pela primeira vez, eu fiquei com medo da gente estar deixando de ser criança… fiquei com muito medo. Se o Pilha pegar mesmo a camisa, acho que ele não vai só roubar uma roupa… acho que vai roubar nossa criancice…


Por Luís Augusto Menna Barreto


sábado, 8 de abril de 2017

pensamentos perdidos - O CIRCO - um conto de Ana Isabel Rocha Macedo - parte 6 de 7


Pensamentos Perdidos: O Circo - um conto de Ana Isabel Rocha Macedo

O CIRCO
(Parte 6 de 7)

ANA ISABEL ROCHA MACEDO

*Respeitável público!!!! O blog “menna em palavras” orgulhosamente apresenta um circo! Um outro CIRCO! Desta vez, descortina-se o CIRCO de Ana Isabel Rocha Macedo, que brinda o blog e seus leitores com um conto inédito que está sendo publicado em sete partes!  Esta é a quinta! Venham! Comprem seus ingressos, a pipoca, a maçã do amor, as raspadinhas, o suco… venham todos!
Óh… shhhhh…… rufam os tambores… abre-se a cortina… sshhhhh…….
(Nota do “editor” Luís Augusto Menna Barreto)

VI

À noite, junto com o malabarista aprendiz, fiz minha primeira apresentação com as malabares. E não posso negar que foi um sucesso.
Um mês, dois, três... Eu já era quase uma malabarista. 
Certo dia, entretanto, no momento da apresentação, ao fazer um dos movimentos com as malabares, meu olhar se deparou com o trapézio. Aí... pela primeira vez errei em público o movimento e deixei uma das peças rolar pelo chão.
Fiquei triste com o meu primeiro desacerto, assim para todos verem, no jogo do malabar. Mas continuei me apresentando.
Um mês, mais outro, cinco meses, um ano... Aí eu já era uma malabarista de verdade.
Mas havia o trapézio lá em cima que, de quando em quando, puxava o meu olhar.
Durante todo este tempo, o palhaço que me salvara dos leões, mesmo sem me dizer uma única palavra, ensinou-me a pintar a minha máscara. Entretanto, reparei que ele nunca se apresentava sem a pintura no rosto, sem o nariz de bola vermelha e sem o chapéu de três pontas que quase encobria seus olhos.
 Isso me deu a ideia, que para mim foi uma libertação. Passei também a viver sempre pintada. Aí não precisei mais andar pelos cantos escuros, a fim de esconder o monstro que eu me tornara. Agora, eu era uma figura excêntrica, quase mítica. Chamava a atenção por onde passava, mas eu não era mais um horror.







quarta-feira, 5 de abril de 2017

poesia de ver - "...sinta-me!"

Poesia de ver: “… sinta-me!”



Eu a olhei com piedade… 
Mas ela não falou das pétalas que murcharam…
… não falou do caule que lhe quebraram…
… não falou da beleza perdida.
Ela sorriu: “vem… chega mais perto… deixa eu te dar o que tenho de bom: sente meu perfume!”


Imagem e texto por Luís Augusto Menna Barreto



domingo, 2 de abril de 2017

crônica - O De Testa, o Goela e a Maria da Penha

O De Testa, o Goela e a Maria da Penha


“Nem me liga, Afrodite, nem me liga!”
E logo em seguida aquela risada espontânea e contagiante do Goela, quando ele mesmo achava graça do que contava!
Parece que a risada que não durou muito, mas que teve graça, teve!
Eu lembrei disso, porque estava em mais um dia de audiências “Maria da Penha”. Isso mesmo: aqueles casos de violência doméstica. Tá bem, o conceito “violência doméstica” não tá muito certo, porque tem vezes que aparece um caboclo lá, com a cabeça quase rachada de perna de mesa, diz que quer denunciar a pequena “por Maira da Penha”, e sai frustrado. A gente explica que não tem “Maria da Penha” pra homem.
Eu tento até falar que, tendo sido agredido, ele pode denunciar a agressão, fazer um boletim de ocorrência porque de qualquer forma agressão é crime, só não dá pra ser por meio da Lei Maria da Penha, mas isso não adianta. O caboclo sai frustrado, porque queria mesmo era colocar a esposa no “Maria da Penha”!
Aliás, duas observações sobre o que eu falei nos dois parágrafos anteriores: A primeira é sobre a "cabeça rachada com uma perna da mesa”: incrível como as mulheres, na hora da raiva, conseguem arrancar pernas de mesa, e tascar bem no meio da cabeça dos homens. Pra quem não sabe, é muito mais comum do que pensam por aí! A segunda observação é sobre o caboclo sair frustrado da delegacia ou do Poder Judiciário quando descobre que não tem uma Lei “João da Penha”! Eu lembro, por exemplo do caso do “De Testa” (não, eu não sei porque chamam ele assim!) que insistiu por umas três vezes que queria tirar a “Zilda Fala Pouco” de casa. E foi tudo no mesmo mês! 
Tô eu, tranqüilo, no Fórum, num dia normal, despachando sobre um caso de furto de bicicleta, quando o Goela avisa que tem um sujeito que quer falar comigo. Como sempre, disse que entrasse, e dali há pouco entra um caboclo justamente com a testa ensanguentada: 
“Me ajuda, doutor!” E apontava pra testa!
No momento que ele entrou, quase que digo “não sou médico”, mas esperei um pouco!
“Me ajuda, doutor!” E apontava pra testa!
Daí, fui eu que enruguei a testa e levantei os ombros daquele jeito “sim, desembucha!”
“Me ajuda, doutor!” E apontava pra testa!
Pronto, não segurei a vontade: 
“Não sou médico. E pára de caminhar de um lado pro outro, que pelo menos vai ficar mais fácil de limpar o sangue do chão!”
“Mas me ajuda, doutor. Foi a Fala Pouco, doutor. Ela que fez isso comigo! Só porque eu tomei uma cachacinha e cheguei com fome, doutor, ela fez isso!”
Fiquei em silêncio. Esperando…
“É Maria da Penha, doutor! Tem que fazer ela sair de casa e ficar longe de mim cem metros e chamar para audiência”.
“Hein?” (Acho que o De Testa já tinha passado por essa situação ao contrário, porque até que tava sabendo de como funcionam algumas coisas… só que ao contrário: em favor das mulheres!
"Maria da Penha, doutor!”
Daí, expliquei que não poderia ser pelo procedimento da Lei Maria da Penha, e que ele poderia, em todo caso, ir até a delegacia, contar o que houve, registrar a ocorrência e a agressão seria investigada. Entreguei para ele, um folheto explicativo, sobre as situações de violência doméstica.
Não serviu. O De Testa saiu muito decepcionado.
Não deu nem dez dias, e, de novo, o De Testa no Fórum. O Goela abriu a porta sorrindo: 
“Doutor, de novo!” E nem deu tempo de eu perguntar “o quê”, foi fazendo o De Testa entrar. Entrou quase chorando e, no lado do pescoço, uma marca vermelha como se tivesse levado uma paulada com um cabo de vassoura. 
“Agora, doutor! Agora é! Agora é Maria da Penha!”E apontava para o pescoço!”
Lembrei de uma assessora muito espirituosa que eu tive que falava: “Dai-me paciência, Senhor, porque se me der coragem, eu mato esse desgraçado!”
“Doutor, agora é Maria da Penha! Olha: igual no folheto! Ela me bateu com a vassoura, doutor! Agorá é!”
“Mas De Testa, não é isso que tá no folheto! Tu não leste?”
“Mas é igual tá no desenho, doutor!”
O De Testa não sabia ler. E, no folheto, tinha alguns desenhos exemplificativos, em que aparecia uma vassoura com um “X”, tanto quanto vários outros utensílios domésticos, advertindo e alertando para evitar-se situações de violência e orientando os procedimentos em caso de eventos de agressões físicas, psicológicas ou meramente verbais.
Vou eu, explicar o folheto para o De Testa… ai, paciência!
Expliquei, também, que a Lei Maria da Penha protegia, especialmente as mulheres no âmbito da convivência doméstica, etc, etc, etc…!
Mais uns poucos dias, e o Goela abre a porta:
“Doutor, seu freguês!”
“Que fre…” E o De Testa veio entrando, com a camisa toda rasgada!
Entrou, olhou pra mim, sem dizer nada. Ficou parado na porta.
Também não falei nada, olhei, coloquei o rosto meio de lado, encolhi os ombros levantando as palmas das mãos e ele entendeu!
Virou as costas e saiu de novo. Assim. Acho que já estávamos ficando íntimos! Nem precisávamos mais falar e já nos entendíamos!
Depois disso, o De Testa não pareceu mais.
Dali um tempo, chegou um auto de flagrante delito de Maria da Penha e eu me lembrei que o De Testa nem havia mais aparecido. 
“Chegou o preso, doutor”, disse o Goela.
Fui para a sala de audiências para realizar a audiência de custódia, peguei o processo pra olhar enquanto encaminhavam o preso: “Orisvaldo Pinto Rocha, vulgo De Testa”.
E o De Testa entra, algemado, e sorrindo! Parecia bem à vontade, foi logo sentando e falou comigo, todo faceiro:
“Agora acertei, né doutor?”
“Hein?”
Pois é! Lembrei dessa história, por causa do Goela, que apareceu, outro dia, com o olho roxo. Quando fui comentar do olho, ele veio logo dizendo: “Maria da Penha, doutor”.
“Até tu, Goela, mas tu sabes que Maria da Penha não tem pros barbados! É só se as mulheres são agredidas!
“Ah, doutor, mas o senhor não sabe como eu deixei a mão da Afrodite com a ‘olhada' que eu dei na mão dela. Fiquei até com pena! Acertei meu olho em cheio nos ossinhos da mão dela, doutor, que não sei se não quebraram!”
Estão perguntando por quê? Tudo bem, eu conto: acho que todos já ouviram uma música chamada “Domingo de Manhã”, que tem uns versos assim:
“Poderia estar agora num hotel mil estrelas em Dubai, mas eu prefiro estar aqui, te perturbando domingo de manhã”!
Pois o Goela estava com a Afrodite e uns amigos na lancheria do hidroviário, quando tocou essa música e ele falou pra Afrodite:
“Se eu tivesse num hotel em Dubai, ia preferir estar aqui te perturbando? Nem me liga, Afrodite, nem me liga!”
Pimba! Maria da Penha. O Goela acertou o olho bem na mão da Afrodite!

Por Luís Augusto Menna Barreto