Eu, o Pilha e a Caixa Mágica
Como ele faz isso? O Pilha é mágico!
— Cadê, Pilha? Tava ali!
— Tu é muito otário!
O Pilha apareceu com uma bolinha de esponja. Igual as que a gente bota cola pra matar a fome cheirando, mas essa era uma bolinha bem pequena. E tinha três copos de plástico que ele deve ter pego em alguma lixeira por aí. Copo é muito fácil de achar. Não… acho que tudo é muito fácil de achar, porque tudo que a gente precisa a gente acha no lixo. Rico joga tudo fora! Também, acho que morando naquelas casas empilhadas uma em cima da outra, nem deve caber muita coisa e tem que ficar jogando fora mesmo!
O Pilha apareceu com um pedaço de papelão, os três copos e a bolinha. Daí, ele colocou os três copos virados pra baixo, e colocou a bolinha dentro de um deles. Foi no do meio, eu vi! Daí ele misturou um pouco os copos, mas eu fiquei cuidando. Não tirei o olho do copo da bolinha. Então ele perguntou onde a bolinha tava. Eu vi que ela ficou na bolinha do lado do meu "braço de pedir”. Eu falo “braço de pedir”, porque não entendo esse negócio de “lado direito e esquerdo”. Como pode lado ter nome? E como pode um lado ter um nome desses, se tem vezes que me viro e daí já falam que o nome dos lados trocou de lugar? Acho muito complicado isso de lado ter nome. Então eu falo “braço de pedir” porque eu acabei descobrindo que sempre que tô na sinaleira trabalhando com o Pilha, é com a mesma mão que eu peço as moedas na janela dos carros.
A bolinha tava do lado do meu “braço de pedir”. Daí quando eu fui levantar o copo, o Pilha disse que apostava que não tava. Mas é claro que tava lá, eu sabia! A gente apostou duas moedas. Daí, ele estendeu o papelão pra mim enquanto eu pegava as moedas na cueca. Achei o Pilha muito otário, porque eu tinha visto que tava no copo do “braço de pedir”… mas não tava! Não sei como ele fez isso! Ele só ficou rindo! A bolinha tava do outro lado! Como pode? Eu pedi pra ele fazer de novo e daí eu não desgrudei a olho. Acho que nem pisquei! Daí quando eu fui levantar, acho que ele ficou com pena e resolveu devolver uma das moedas. Daí ele me deu a moeda e estendeu de novo o papelão com os copos na minha direção. Eu vi que a bolinha tinha ficado no copo do outro lado, dessa vez. Mas quando eu levantei o copo… não tava lá! Como pode? Tava no lado do “braço de pedir”! O Pilha ria muito.
— Bora mané! Vamos ganhar dinheiro duns ricos!
Quando a gente tava indo pro centro, eu lembrei da outra vez que o Pilha fez mágica pra mim. A gente era pequeno ainda. Foi antes do Pilha me ensinar como fazer pra andar de carro, quando ele disse pra eu atirar a pedra no vidro do shopping e fui de carro até o juizado!
Eu lembro: ele apareceu na sinaleira dizendo que ia me mostrar uma coisa muito doida, que eu não ia acreditar. Mas tinha que ter coragem! Sempre que o Pilha fala que tem que ter coragem, eu fico com medo. Porque sempre que ele diz isso, tem alguma confusão. Mas eu fui, né. Morrendo de medo.
— Êh, Pilha. Que tá pensando?! Sou mais corajoso que tu!
Fui com ele até o centro. Daí ele mostrou um daqueles prédios altos, que tem uma casa em cima da outra, parecia o prédio do Uálquin, que mora em frente ao parquinho. Tinha uns latões de lixo perto e fomos pra lá.
— Vamos pegar o quê, Pilha?
— Que mané pegar?! Deixa de ser otário. Tem que se esconder aqui, óh. Abaixa. Tá vendo aquela porta lá dentro, na frente do balcão?
Tinha um balcão e um homem velho que ficava sentado atrás. E tinha uma porta esquisita na parede do outro lado, na frente do balcão. De repente a porta abriu, um pedaço pra cada lado, e saiu um homem lá de dentro. Falou com o velho do balcão e saiu. E a porta fechou sozinha! Não dava pra ver o que tinha do outro lado da porta.
— Ó, mané, fica esperto. Quando a porta abrir de novo, a gente tem que correr lá pra dentro. Mas tem que ser rápido, senão o velho pega a gente.
Eu fiquei apavorado! O que será que tinha do outro lado daquela porta que o Pilha queria me mostrar? Eu tava morrendo de medo.
Daí, a porta abriu de novo e saiu uma mulher de dentro.
— Espera… espera… vem! Corre mané!
O Pilha saiu correndo e eu nem pensei em nada, saí correndo atrás dele, louco de medo! A gente passou voando pela mulher e pelo velho, e corremos pra porta. Eu fiquei mais assustado porque quando o Pilha passou correndo na porta, alguém começou a fechar a porta, porque ela quase me esmagou. Daí, eu bati numa parede e fiquei mais assustado ainda. Ouvi o velho gritar… e eu tava zonzo, porque bati em alguma coisa e o Pilha parecia que tava apertando um monte de botões, rindo.
Eu não entendi bem, porque não tinha nada ali! Era só uma caixa com uns botões, por isso que eu bati na parede, porque não tinha nada! Fiquei com mais medo ainda. E acho que eu tava muito tonto com a batida, porque deu uma sensação muito esquisita, parecia que minhas pernas ficaram pesadas, e eu senti vontade de vomitar. E quase caí, parecia que eu tava pesado.
O Pilha só ria. E me falou:
— Te prepara pra maior mágica da tua vida mané!
— Pilha, o velho vai pegar a gente. Tu é doido? O que tem nessa caixa?
— Cala a boca, otário. Vou fazer uma mágica. Vou fazer o velho e a mulher e tudo desaparecer, olha!
Eu tava com muito medo. Daí, teve uma sensação esquisita, como se o chão tivesse tremendo… e a porta abriu!
Meu Deus! Eu fiquei muito apavorado! Era verdade! O velho desapareceu, o balcão desapareceu. Tava frio. E escuro. Até o dia desapareceu.
Depois a porta fechou de novo e o chão tremeu mais uma vez. Eu fiquei com ânsia de novo… acho que bati muito forte na parede quando entrei na caixa! A porta abriu de novo. O Pilha me empurrou pra fora. Eu tava com muito medo. A porta da caixa fechou. Tava tudo escuro. O Pilha ria que se matava! Eu tava apavorado. Não enxergava nada.
— Caramba, Pilha, a gente morreu!
Demorou um pouquinho e a porta da caixa abriu sozinha de novo. Entrei correndo.
— Pilha, faz tudo voltar! Ta doido! Não quero ficar morrido!
— Dexia comigo, mané! Mas olha: quando eu fizer tudo voltar, vai voltar até o velho e a gente vai ter que sair correndo!
Eu tava tão apavorado que nem me importava de levar uns cascudos do velho. Só queria desmorrer e ver tudo de novo!
Daí, depois de o chão tremer de novo, a porta abriu! E tava tudo lá! O dia, o balcão, o velho. O Pilha saiu correndo e fui atrás dele! O velho ficou gritando! Eu acho que nunca corri tanto na minha vida!
Até hoje não sei como o Pilha fez aquilo!
Hoje, vou ficar cuidando pra descobrir o truque do Pilha com essa bolinha.
… e um dia, eu descubro o truque da Caixa Mágica!
Por Luís Augusto Menna Barreto