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sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

COVID no Marajó: o Goela, o Álcool e a Cerveja



Sinceramente, se nosso país fosse mais sério com a saúde, se tivéssemos bons investimentos em ciência, se nossos governantes realmente se importassem com a população, eu tenho certeza que o Marajó estaria, neste momento de pandemia, sendo estudado.

O Marajó, no início da pandemia, fora notícia nos veículos de comunicação, pela altíssima taxa de contágio. Vamos esclarecer que no Marajó, há o Hospital Regional em Breves (a maior cidade do Marajó, com mais de cem mil habitantes), mas nas demais cidades da Ilha, os hospitais são lamentavelmente precários. 

Muito já contei aqui nas crônicas de Marajó City, dos percalços da ambulância, em que raríssimas vezes efetivamente transportou enfermos. Sendo o hospital a menos de quinhentos metros do trapiche municipal, muito mais se levam os enfermos na maca, para embarcarem para tratamento em Belém (rezando para que resistam às mais de 10 horas de navegação em rios que parecem mar), do que se os transportam na ambulância. Não que seja mais trabalhoso levar o enfermo na ambulância, do hospital ao trapiche… O problema é o motorista, o Manobra! Não que seja difícil encontrar, é até simples: basta ir no açougue do Retalho, ou no Bar do S. Nonô. O problema é ele estar sóbrio a ponto de encontrar a chave da ambulância! 

Pois bem, mesmo com este cenário de precário atendimento da saúde pública, o fato é que a taxa de óbitos por COVID no Marajó não foi tão grande. Pelo contrário. Se de um lado houve muita contaminação, de outro, os óbitos foram proporcionalmente baixos. 

Já no início da pandemia, como eu disse, meus amigos todos no Marajó, haviam sido contaminados! Mas não houve lockdown por lá. Como se poderia esperar, o Marajó, com suas peculiaridades, encontrou sua maneira! As festas, ao contrário de todo o resto do Brasil e quiçá do mundo, continuaram. O que aconteceu, foi que passaram a ter festas para quem estava testado positivo e festa para quem estava testado negativo! 

Já no começo, as festas disputavam pessoa a pessoa, quem registrava o maior número! Mas, com pouco tempo, as festas dos positivos passaram a dar mais gente. Logo, não houve mais festas para os que não haviam, ainda, sido atingidos pelo vírus. O “Xérica" ganhou um bom estoque de açaí, vendendo falsos atestados positivos, para que os negativos pudessem entrar nas festas. Casais foram desfeitos por conta de resultados de exames. Os caboclos rejeitando morenas testadas negativas, porque não poderiam namorar. Morenas dispensando caboclos testados positivos, acusando-os de terem sido contaminados por fazer saliência com quenga positiva! 

Fato curioso foi na questão religiosa: Os Padres da cidade, ciosos de cuidarem-se acabaram não contraindo a COVID. Daí que avisavam que na missa só poderia ir quem estivesse negativo e sentando duas pessoas a cada banco. Os pastores das igrejas evangélicas, por sua vez, aproveitaram o momento: declararam-se positivos, e anunciaram que os cultos estavam abertos aos positivos. Pra não deixar de cumprir obrigação religiosa, houve uma onda de conversão. 

Quem apostou na pandemia, acabou por se dar mal no Marajó. O Quebrado foi um deles. Antes, um esperto comerciante atento às oportunidades, nascido Abraão Antônio de Deus, foi um dos primeiros a prestar atenção às notícias de que o Marajó estava com uma das mais altas taxas de contaminação do país. Pois lá foi, com um estoque pra mais de dez mil máscaras compradas na 25 em São Paulo. Atravessou o país, com seu carregamento de máscaras, e tratou de alugar um espaço na rua da Beira, bem na frente do trapiche do Leão do Marajó! Não conseguiu vender nem para o aluguel, e em menos de um mês, já ganhou o apelido de “Quebrado”.

Mesmo com toda a contaminação, o fato é que só se via máscaras nos funcionários da Justiça Eleitoral e no posto da Receita Federal. 

Mas nem tudo foi esquecido pelo povo Marajoara! O álcool gel, por incrível que pareça, foi adotado pela população. Até nas rodas de cerveja, sempre tinha alguém que levava o vidro de álcool gel para benefício de todos. E foi daí que o Goela foi parar no hospital!

Em pleno dia de Natal!

Pois o caso é que o Goela, em recesso do fórum, estava com vários amigos tomando umas! Umas não: várias, na verdade! E o vidro de álcool gel ali na mesa, passando de mão em mão.

No começo, nunca tem problema! Como vários pegam as garrafas, o álcool vai sendo passado de um para o outro. Gel na mão, pega a garrafa e serve mais uma rodada… e assim vai.

O problema é que pelas sei lá qual rodada, o Goela (como vários) já estava ficando porre. As histórias de que o sujeito acaba “trocando as bolas” e bebe álcool no lugar da cerveja, já é lugar comum no Marajó. Mas não foi por isso que o Goela acabou no hospital. Beber o álcool em vez da cerveja não mata ninguém. O problema do Goela foram as costelas quebradas!

Ele fez o contrário: pegou a cerveja e derramou nas mão como se fosse álcool gel! E isso não é perdoado! Acabou pegando porrada por desperdiçar a cerveja!


Luís Augusto Menna Barreto

25 de dezembro de 2020.

sábado, 24 de outubro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - parte 12 - epílogo

 


Parte 12 - epílogo


Ela estava, mais uma vez, escolhendo laranjas, quando ele chegou:

— Ah, você está aqui! Que bom. Eu preciso mesmo voltar para a corretora. Depois você pode dar um jeito de encontrar queijo Beaufort d’Ete?! Ficará perfeito com o salmão e o vinho que o Olavo trará para o jantar. Combinei com ele e a Marta às 9 da noite. Tudo bem para você, né?! Você anda saindo mais cedo? Bem, não importa, você tem feito um excelente trabalho nos últimos dias, sua cadeira está com excelentes rendimentos. Vou deixar este salmão aqui no seu carrinho. Vá direto para casa e mande a Vera preparar o jantar para ser servido  às 10 da noite.

Ela apenas sorriu. Terminou de escolher as laranjas, deixou o salmão no carrinho, fez o resto das compras e dirigiu-se ao caixa. Passaria, ainda, para comprar batatinhas antes de ir para casa, mas não iria demorar-se. Queria que o jantar fosse perfeito.

Por volta de 21h15, a campainha. 

Ela nem lembra quando foi a última vez que estivera ansiosa para receber alguém em sua casa. Ele se levantou, mas deixou que ela fosse receber os convidados. 

Como nem lembra de já haver feito, assim que abriu a porta, em vez de um cordial cumprimento, ela logo abriu os braços e abraçou. Um abraço forte! 

— Que bom que vocês vieram!

— Amigaaaaa! Eu não perderia esse jantar por nada! — Disse-lhe Bel, e foi logo entrando, e dando também um abraço em Marcos, enquanto ela cumprimentava a outra convidada:

— Dora, bem vinda! Entre! 

Jantaram na pequena mesa para 4 pessoas, no apartamento que, aos poucos, ganhava elegantes detalhes de decoração, promovidos por ela, mas que Marcos, a cada detalhe, gostava mais. Porta retratos com recortes de revista em que ela aparecia, agora exibiam fotos recentes dos dois. Mas o quadro com antiga foto da escola, agora restaurada digitalmente, em que ela, Marcos e Bel apareciam, ocupava o lugar de destaque na parede da sala.

Quando ela trouxe o prato que havia preparado, Bel comentou:

— Amiga! Salmão! Adooooro!

— Foi sugestão de um conhecido que encontrei no supermercado. — ela disse. — Mas tenho as suas batatinhas, Dora, se vocês preferirem!

— Querida, se você servir batatinhas, eu juro que chamo um Uber agora mesmo!

Aquele seria o primeiro de vários jantares que se passariam sempre entre deliciosas risadas, naquele pequeno apartamento.

Da vida que até então havia vivido, ela tinha um bom dinheiro guardado, que lhes permitiria morar em bairros mais nobres, ou mesmo dar a ele o carro que escolhesse. Mas decidiu que deixaria o dinheiro guardado e somente o usaria aos poucos, apenas para pequenos detalhes de conforto para os dois, sem tirar a essência da vida que ele havia construído. De qualquer forma, estaria tranquila pra enfrentar qualquer imprevisto ou emergência. Ela o via feliz todos os dias com a vida que levava. E descobriu-se feliz ao lado dele, aprendendo a comparar preços, fazer contas para realizar planos, e saindo de bicicleta com ele aos finais de semana.

Montou um escritório virtual de aconselhamento financeiro para pequenas empresas, e Bel foi uma de suas primeiras clientes. 

Haveriam de ter filhos! E ela pedia a Deus, para que os filhos tivessem a oportunidade de viver a vida que ela agora experimentava! E com todas as suas forças, agradeceu por ter tido - e haver entendido e aceitado - uma segunda chance.

Quando Olavo e Marta tocaram a campainha pela segunda vez, foi que o corretor deu-se conta de que ela não fora atender. Gritou por ela, e não obteve resposta. Então, gritou por Vera, a empregada, e também não obteve resposta. Por volta de 19 horas, depois de levar para ele uma cerveja e os canapés na sala de televisão, Vera havia saído, porque ninguém lhe dissera que haveria um jantar.

Irritado, ele foi receber o casal e não soube esconder o constrangimento, quando descobriu que a casa estava vazia, e nada havia sido preparado.

No dia seguinte, chegando na corretora pouco depois da metade da manhã, desceu até o andar da sala dela e perguntou aos gritos, onde ela estava. Descobriu, de uma hesitante secretária, que havia mais de 30 dias, que ela não trabalhava mais ali, e que havia posto um outro corretor em seu lugar, cuidando da sua carteira de clientes. 

Depois de interrogar mais duas funcionárias, ele ouviu sobre Dora e que esta tal vendedora de batatinhas poderia saber alguma coisa.

— Você sabe onde ela está? — ele perguntou sem sequer dizer “bom dia”.

Dora intuiu que fosse “o corretor”, pelo terno impecável que usava, pelos sapatos maravilhosos mas, especialmente, pela maneira com que falou com ela.

— Querido, este é um carrinho de venda de batatinhas, não de informação. Eu converso com todos que comem minhas batatinhas!

— Deixe de bobagem! Diga-me logo!

— Sem batatinhas, sem conversa — disse com um sorriso divertido!

De algum jeito, Dora divertiu-se com aquele “cliente”. Ele acabou comprando batatinhas. Achou o preço absurdo! Mas Dora havia cobrado caro porque deu dois conselhos, e um deles, ela sabia que ele não seguiria:

— … primeiro, procure as respostas no seu guarda-roupas!

— O quê? Que bobagem! Você deve ser louca!

— … e o segundo conselho: depois, não procure mais. 

Naquela noite, ele decidiu que esperaria acordado por ela, e teria uma conversa séria. As coisas não poderiam ficar como estão! Ela deveria avisar-lhe sobre as decisões na corretora! Esperou até 1h da manhã, e então adormeceu no sofá. No meio da madrugada acordou e decidiu que a acordaria mesmo àquela hora, para falar com ela. Mas não a encontrou na cama. Não a encontrou na casa. Então, lembrou-se do conselho da mulher das batatinhas, e, mesmo se sentindo tolo, foi até o closet e abriu as portas. Havia alguns vestidos de festa. Havia alguns sapatos caríssimos. Mas alguém havia tirado todo o resto de lá. E chamou-lhe especialmente atenção, que uma velha caixa de sapatos que ele sempre via quando ela abria as portas do closet, não estava mais lá.

(Cenas de 5 segundos cada, enquanto sobem os créditos da equipe técnica e aumenta a trilha sonora final):

1 - Ela e Bel comendo batatinhas na calçada e rindo enquanto Dora conta alguma história!

2 - Ela e Marcos andando de bicicleta em uma manhã de sol!

3 - Ela, Marcos, Bel e Dora rindo tomando cerveja em copos de vidro, em volta da mesa pequena no apartamento!

4 - Ela, grávida, posando para Marcos fazer fotos do álbum do bebê!

5 - Ela e Marcos montando o berço, enquanto Dora e Bel pintam as paredes do quarto do bebê!

6 - Ela, na cama do hospital, segurando o bebê, com Marcos de um lado e as madrinhas do bebê: Bel e Dora, de outro!

7 - Imagem fechando no carrinho da Dora, onde diz “Batatinhas da Dora”!

7 - Apagam as cenas, sobe a palavra FIM.


Luís Augusto Menna Barreto

12.10.2020

domingo, 18 de outubro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - parte 11 - final*

 


Parte 11 - final*


Os quase 15 minutos que esperou naquela esquina, em um bairro que jamais havia entrado antes, pareceram horas. Foi difícil enxergar o Volvo C60, por conta do sol que começava a despontar em meio àqueles conjuntos de prédios simples.

Ela se sentiu aliviada quando o carro parou ao seu lado, abaixou o vidro e ela pode ouvir:

— Amiga! Entra! Conta tudooooo!

Ela ainda estava tremendo. Mas não era medo. 

Nos quarenta minutos que se seguiram, até o supermercado onde ela havia deixado o carro, ela contou para Bel suas últimas 18 horas… desde a decisão em vestir jeans e All Star, até o erro que cometeu e que originou a crise.

— Não acredito! E você saiu assim? O que você disse pro Corretor?

— Nada. Ainda não falei com ele!

— E para o diretor da empresa que você fez a operação errada? 

— Eu disse a verdade: que não poderia fazer mais nada, porque iria comprar laranjas!

— Loucaaaaaaaa!

— Riram… até que Bel olhou nos olhos dela, apenas sorrindo.

— O que foi, Bel?

Bel pegou forte na mão da amiga:

— Que bom que minha amiga voltou. É bom ter encontrado você hoje!

Mas nós já nos encontramos semana passada!

— Não… só AGORA eu estou reconhecendo a minha melhor amiga! Minha amiga que me ensinava a não ter medo da vida!

Ela se jogou para trás na poltrona. Fechou os olhos uns instantes. E relembrou tudo. Desde o momento em que entrou no supermercado decidida a comprar laranjas, com alguma certeza dentro de si dizendo que ele iria encontra-la, até o momento em que ligou para Bel, porque foi a única pessoa em que pensou que poderia confiar. 

Lembrou a tensão, quase náusea, que sentiu no momento em que ele abria a porta… e a surpresa que viveu, ao dar os primeiros passos naquela sala simples… Era tudo arrumado de tal forma, que a fazia sentir-se à vontade. Viu o aparelho de DVD antigo, e a caixa do filme Shakespeare Apaixonado, um dos filmes que mais gostara na vida… Então, olhou a pequena mesinha ao lado do sofá simples, mas confortável, e viu um porta retratos com uma fotografia sua, que havia sido usada em uma revista de economia. 

Numa pequena estante, porta retratos da turma da escola, e viu uma foto em que ela estava ao lado de Bel e ele do outro lado… e viu que todos menos ele, olhavam para a foto… ele a olhava no instante em que o fotógrafo disparou.

Lembrou-se de como ele falava naturalmente com ela, enquanto colocava as compras nos armários da cozinha, de como sentiu gentileza e carinho em sua voz, quando perguntou se ela não preferia tomar um banho enquanto ele fazia o drink.

— Sua toalha eu já tirei do varal e coloquei atrás da porta. Quando você terminar o banho, estará pronto seu drink.

Ela não tomaria banho. Mas queria ver mais daquele pequeno apartamento. Foi até o banheiro, o único do apartamento, que ficava imediatamente antes do quarto, e viu: duas escovas de dentes. Alguns cremes da Natura, que pareciam nunca terem sido usados. Uma toalha amarela, quase creme, atrás da porta, ao lado de uma toalha com tonalidade mais escura, mas que era fácil identificar que era um conjunto. Aventurou-se pelo apartamento, e havia mais duas peças: uma, onde havia uma escrivaninha, simples, mas bem arrumada, uma prateleira com alguns livros, poltronas e uma estante. Ela reconheceu algumas das revistas de economia que ela mesma comprava… alguns jornais dobrados com cuidado, mas que dava para ver que havia alguma coisa marcada. E então percebeu que, em todos os jornais e revistas que ele guardava, havia matérias a seu respeito ou que ela fora entrevistada. 

Entrou no quarto e viu a cama, tão menor da que estava acostumada a dormir, mas pareceu-lhe tão aconchegante. Ousou abrir o guarda-roupas… era simples, com quatro pequenas portas e um maleiro em cima. Duas portas estavam ocupadas com roupas dele.  E nas outras duas, apenas uma calça Jeans simples, feminina, que ela achou que seria seu tamanho, e duas blusas brancas penduradas… … mas quando olhou pra baixo, seu coração disparou: um All Star que parecia que nunca fora usado… 35… seu número… 

— Amigaaaaaaaaa!!! Acorda! Conta!

Despertou de seus pensamentos e contou tudo para Bel.

— Você dormiu com ele, amiga?

— Não… e sim…

— Pára! Como isso? Conta logo!

— Bel… foi tão… diferente! Daí, voltei pra sala e ele veio com uma taça com Cointreau. Era um fizz com laranjas… Tão bom! Eu me sentei e ele perguntou sobre meu dia, se tinha sido bom, se eu estava cansada… ele… ele se importava comigo! E depois ele perguntou que filme eu queria ver… Ele me abraçou, Bel, no sofá e eu simplesmente adormeci. Eu me senti tão bem, tão acolhida…

— Mas amiga? Só isso? Nem um beijo?

— Ai, Bel… foi tão mais intenso que beijo, que sexo…

— Ah!, pára! Amiga, acho que vou levar você para uma psicóloga, não para seu carro! Abraço mais intenso que sexo?! Você precisa de ajuda! — Riram. — Mas conta: e aí?

— Aí nada! Acordei quase pela manhã, deitada no sofá. Ele havia colocado um cobertor, tirado meu calçado, e estava dormindo, também, sentado no sofá com meus pés em seu colo. Eu levantei com cuidado para não o acordar, e fui descalça até fechar a porta bem devagar. Daí, coloquei o calçado e a única coisa que me veio na cabeça foi mandar mensagem para você, e torcer para que você pudesse vir buscar-me!

— E você já pensou no que vai fazer?

— Não.

— E você já pensou como vai resolver o problema na corretora?

— Não?

— Você ao menos pensou o que vai dizer pro corretor chegando em casa essa hora?

— Não!

— Meu Deus, amiga! Você pensou em alguma coisa?

— Sim… em comer batatinhas! E voltar lá!


Luís Augusto Menna Barreto

15.9.2020

*Domingo que vem, o epílogo. Explicações, destinos, a vida das personagens, como ficou.

** Em breve, um "spin off" da DORA: uma parte de sua vida e de seus dramas pessoais. No fim, somos todos, "gente"...

domingo, 11 de outubro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - parte 10


Parte 10


18 horas antes de chegar em casa naquela manhã em que o marido gritou com ela, ela escolhia laranjas. 

Era estranho, mas ainda não estava preocupada por, minutos antes, haver saído no início do que ela sabia que seria uma crise, por erros que ela própria cometera. Mas Sabia que não conseguiria concentrar-se no trabalho. Depois pensaria no tamanho do problema, depois pensaria nas explicações que deveria dar aos clientes, depois pensaria no que diria ao seu marido.

Naquele momento, tentava concentrar-se unicamente em escolher algumas laranjas. Não fazia idéia de quantas pegar. Olhou em volta… o mais variado tipo de pessoas, no entorno das gôndolas com frutas e verduras, empurrando carrinhos, algumas conversando, algumas em seus celulares… Um sentimento quase esquecido, trouxe-lhe um sorriso, por de repente achar que poderia pertencer àquele mundo. Agradeceu por ter tido coragem de novamente colocar jeans e All Star. 

Estava, ainda, com o saco plástico na mão, com oito ou nove laranjas, concentrada naquele sentimento que lhe parecia tão prosaico, mas, ao mesmo tempo, tão acolhedor. Foi despertada de seus pensamentos ao ouvir:

— Quantas pessoas você está pensando em convidar?

Involuntariamente, ela foi tomada de um susto. Ele sorria ao seu lado.

— Eu… eu acho que me distraí. — Ela disse sem jeito, mas se esforçando para parecer natural. Não sabia porquê estava fazendo aquilo, mas sabia que queria faze-lo. Parecia que as frases mais triviais dele, vinham com carinho. Ah!, como ela precisava daquilo!

— Bem, acho que podemos levar apenas duas, certo? 

— … claro… — Ela se sentiu deliciosamente tola ao não fazer idéia de quantas laranjas bastariam para duas pessoas fazerem um drink. Quando retirou quase todas as laranjas, deixando apenas duas, ele pegou da gôndola uma outra não tão madura e disse-lhe:

— Vamos fazer o seguinte: vamos levar apenas uma dessas duas que você já escolheu, e esta aqui, não tão madura. Assim, usamos essa hoje, e corremos menos risco de vermos a outra estragar, está bem? Onde está seu carrinho?

— Nossa, estou distraída demais… acho que eu esqueci de pegar.

— Tudo bem. Coloque no meu. Você quer ir para casa na frente? Eu ainda levo um tempo com o restante das compras, e passo, depois, para comprar as batatinhas. Você pode ir tomando banho, e quando chegar, eu preparo o drink.

— Não… quero ir com você. Eu gostaria que fossemos direto, hoje. Vamos deixar as batatinhas para outro dia… queria apenas ir logo.

Ele a olhou como ela nunca o fora antes olhada. Ela viu seu sorriso, que a atingia na alma… porque era realmente para ela. Por ela.

— Está bem. Vamos. Ainda preciso pegar leite, detergente…

De repente, ela se sentia feliz. Via-o examinar e comparar os preços entre os detergentes, entre os tipos de leite, procurar ofertas… fazia-o tão naturalmente, e, para ela, era algo tão impensável àquela altura da sua vida. Viu-o prestar atenção em cada preço que aparecia quando a operadora do caixa passava as compras. Viu-o contar o dinheiro e guardar com cuidado o troco, sem sequer recusar as moedas que ela jamais pensaria em aceitar de troco.

Quando saíram do supermercado, com ele levando as duas sacolas de plástico, andando lado a lado, fora o instinto dela que agiu… viu-se tocar na mão dele. Ele imediatamente colocou ambas as sacolas em uma das mãos e com a outra, entrelaçou os dedos dela. Ela sentiu arrepiar toda a sua pele, como se um anjo tivesse acabado de passar por ela. E ela notou a delicadeza e segurança com que ele pegou em sua mão, como se tivesse feito isso por todos os dias de sua vida.

Ela lembrou do carro, no estacionamento do supermercado, e quase hesitou. Mas não quis pensar. Não era momento de pensar. Apenas queria esticar aquele instante, o quanto pudesse. Ele a conduziu para um ponto de ônibus. Largou sua mão para pegar o passe no bolso. Quando apareceu um ônibus com cores meio avermelhadas, ele ficou bem mais atento, conduziu-a para mais perto do meio fio, e depois recuou. Antes que o ônibus parasse, ele perguntou:

— Você se importa de esperarmos o próximo? Acho que meu passe tem apenas mais duas passagens, e o próximo deve ser o do Vitor. Daí ele deixa passarmos juntos na roleta, com apenas uma passagem. Estamos adiantados, porque não fui pegar as batatinhas…

— Tudo bem…

Aquilo parecia tão distante… mas tão real para ela. Lembrou-se dos tempos de faculdade, antes de conhecer “o Corretor”, em que ainda andava de ônibus… lembrou-se que também se preocupava com o dinheiro da passagem, do lanche, do cinema… Onde ela esteve esse tempo todo? Sentiu-se como se houvesse dormido um longo sono, e estivesse de volta ao mundo real… a um maravilhoso mundo real. … ou estaria sonhando agora…? Quando iria acordar? Quando teria de enfrentar seu marido novamente? Não! Não era momento de pensar isso. Precisava ir adiante. Simplesmente precisava.

Não soube quanto tempo passou, perdida em seus pensamentos, até que aparecesse o próximo ônibus da linha. E, de repente, notou que esteve à vontade e sentiu-se acolhida durante todo o tempo em que ficara pensando, mesmo em silêncio. Como era possível ela se sentir tão à vontade, mesmo em silêncio, com aquele homem, que ela sequer lembrava e que descobrira que não via há mais de vinte anos?

Ela não hesitou para subir no ônibus, tendo aguardado pessoas entrarem antes, e havendo algumas pessoas depois… com alguma dificuldade, equilibrou-se, em pé, quando o ônibus retomou o movimento. Ele a envolvia, sempre, com um dos braços, como se cuidasse de protege-la e reparou que era algo natural para ele. 

— Fala Vitor! É… será que poderíamos passar juntos? Estou meio apertado esse mês! 

— Marcos! Você e essa gata? Finalmente tirou ela de casa?! Claro que pode! Mas só porque você defendeu o pênalti no último jogo! 

Ele a fez passar na frente, e espremeu-se com ela no mesmo espaço da roleta. Quando passaram, Vitor disse-lhe:

— É um prazer finalmente conhece-la! Mas agora eu entendo porque o Marcos nunca fica para a cerveja no final dos jogos da terça!

Ela parecia em um sonho. Estava com medo de acordar. Quase lhe vinham lágrimas nos olhos ao observar tudo tão vivo em sua volta. Tudo tão real. Enquanto estavam em pé, no ônibus, surpreendeu-se com uma senhora que, sentada, ofereceu-se para segurar em seu colo as compras que ele levava. Aquilo, que talvez fosse tão natural todos os dias, em todos os ônibus, uma gentileza tão trivial, que parecia fazer parte de uma espécie de “código de cortesia de pessoas de verdade” foi-lhe tão profundamente significativo. Depois, vagou um assento, e ele fez questão que ela sentasse. O rapaz sentado na janela, ao seu lado, logo levantou dizendo que desceria dali há duas paradas, e ofereceu para que sentassem juntos. Depois, um senhor que parecia mancar parou perto deles, em pé no corredor, e ela viu o movimento automático de Marcos ao oferecer seu lugar. Ele a deixou sentada ao lado do homem, mas admirou tanto o gesto, e buscava em sua memória quando teria sido a última vez que viu tantos gestos gratuitos de gentileza, e sequer conseguia lembrar!

Quarenta minutos depois, chegaram, já noite, na periferia, em um condomínio de vários prédios com vários apartamentos por andar. Enquanto caminhava de mãos dadas, novamente, com ele, observava os carros populares e motocicletas estacionados em vagas marcadas no chão. Crianças que corriam de bicicletas, jovens reunidos em bancos, conversando com a despreocupação própria da juventude. 

Subiu dois andares pelas escadas, porque havia uma placa que dizia “fora de operação” na porta do elevador. 

Então, somente quando ele colocou a chave na porta, ela realmente ficou apreensiva. De repente, um pensamento terrível passou-lhe pela cabeça: e se houver alguém aí dentro? E se ele for louco e tiver, já uma esposa? Dora havia dito que ele era apaixonado pela esposa. Mas Bel disse-lhe que a reconheceu na foto. Por um instante, seu coração voltou a acelerar, quase se sentiu tonta, nauseada… ficou um instante paralisada… E então, ele abriu a porta.


Luís Augusto Menna Barreto

29.8.2020

domingo, 4 de outubro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - parte 9

 


Parte 9 


— O que deu em você? — ele gritou furioso, enquanto ela recém abria a porta.

Ela temeu por isso, desde o momento em que entrou nas ruas do bairro. Instintivamente, passou a dirigir mais devagar, sem nem saber o que pensar direito. O coração estava, ainda, acelerado, tanto quanto na noite anterior, quando, depois de mais de 10 anos, não entrava em um ônibus… não ao menos no Brasil. O que diria? Como seria recebida? Como explicar a noite fora de casa? Como explicar chegar pela manhã, vestida de jeans e All Star? O que dizer da sacola que trazia na mão? Torcia, com todas as forças, para que ele não estivesse em casa, mas sabia que ele demorava muito a sair e havia manhãs que nem mesmo ia para a corretora, fazendo todas as análises de mercado em seu gabinete em casa.

Quando chegou, viu Romeu, o motorista, sentado em frente à garagem, onde sempre esperava até ser chamado. “Ele está em casa. Meu Deus, o que vou dizer? Como explicar o que eu fiz, onde passei a noite?” 

Parou o carro no imenso pátio da casa, longe da garagem, na esperança que ele ainda estivesse dormindo e não ouvisse o carro chegar. Abriu a porta devagar… e sua esperança de encontra-lo ainda dormindo acabou assim que colocou o pé dentro de casa:

— O que deu em você?

— Eu…

— Seis milhões! SEIS MILHÕES! — Gritou! — Seis milhões e eu tenho de agüentar desaforos de clientes de anos, porque você simplesmente sumiu do trabalho! 

— Eu…

— Seis milhões! 

— Eu não sei o que dizer…

— Pois eu sei! Até o final do dia, você vai ligar para o Arthur, vai tranquiliza-lo e vai dizer pra ele exatamente o plano de recuperação do capital e garantir que ele não vai sofrer perdas. Depois, você vai fazer contato com todos os seus amigos jornalistas e amanhã, em todas as mídias, quero notícias positivas para levantar todos os ativos dele, e…

Ela parecia não entender o que acontecia. Parecia nem ouvir direito o que ele dizia, porque queria procurar, no meio da fúria do marido as perguntas “onde você estava?”, “onde você passou a noite?”, “porque está vestida assim?”… Mas tudo o que ficava fazendo eco em sua mente era: “seis milhões”. De repente, seu coração já nem parecia bater tão forte. Ela já nem se sentia ofendida pela grosseria… simplesmente parecia que eles estavam em universos paralelos que se tocavam ao acaso.

— … e quero você na corretora em 40 minutos!

Ela quase nem ouviu a batida da porta. Estava quase que em choque. Tomou banho sem saber o que pensar direito. Demoraria mais do que 40 minutos, com certeza. Depois, decidiu que escolheria sua melhor roupa de trabalho, seu melhor sapato, sua mais elegante versão de si mesma. E comeria batatinhas. 

— … All Star e calça jeans?

— É.

— 7h da manhã, e sem maquiagem?

— “Urrum" — Concordou enquanto colocava batatinhas na boca.

— E ele estava preocupado com os … quanto mesmo?

— Seis milhões.

— Uau. Adoro ouvir você falando isso, querida! Ele não perguntou onde você estava?

— Não.

— Querida, preciso de um homem assim: que não pergunte onde eu estava!

Riram. Dora fazia-a rir!


Luís Augusto Menna Barreto

19.8.2020

domingo, 27 de setembro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - parte 8

 


Parte  8


— Como assim? — Bel perguntou com espanto.

— Eu continuo casada. Só isso. Com o “corretor”…! — Ela sorriu ao pronunciar “o corretor” que era como como Bel referia-se ao marido. 

— Amiga! Então você está tendo um caso? Conta!

— Não… — Ela respondeu reticente!

— Hum… porque eu sinto que você tem muito para contar-me?!

— Eu… eu não estou tendo um caso. 

— E como você explica ele ter ido comprar um presente pra você? Aliás, uma blusa maravilhosa da minha nova coleção! Não esconda nada de mim! 

—Tudo bem, eu conto tudo… mas, antes, vamos começar com você me dizendo quem é exatamente o “ele” que você fala?

Longe daquele café onde as amigas retomavam o fio de uma amizade em suspenso por muitos anos, ele limpava a cozinha e cortava, com cuidado, um pedaço apodrecido da última laranja que estava guardada para fazer o drink de cointreau que ela gostava. 

A caixa com a blusa que ele sequer soube quanto custara, estava em cima da mesinha, à frente do sofá, onde ele colocava sempre o drink pra ela. “O amor deixa pistas”, dissera Dora. “Espero que ela ache as pistas… porque eu jamais perdi o rastro do amor”, pensava.

— Nossa! O que você coloca nessas batatinhas? Nunca comi nada tão delicioso!

— Elixir da sinceridade! Então, pare de querer enrolar.

— Eu não estou enrolando você, Dora…

— Ah, isso eu sei, meu bem! A mim, você nem conseguiria enrolar. Estou falando para parar de enrolar a si mesma! 

— Eu não sei o que fazer.

— Querida, se você não sabe o que fazer, é hora de fazer uma pergunta.

— Ah, Dora, eu tenho tantas perguntas.

— Não. Você tem a resposta. Mas não está fazendo a pergunta.

— Que pergunta?

— A única que importa, enquanto estamos vivos: “Você está feliz”?

Ela ficou sem palavras. E a batatinha que havia pego no pacote de papel ficou suspensa em sua mão. Sim, ela tinha a resposta. E compreendeu que sempre evitara fazer esta pergunta.

O silêncio foi novamente quebrado por Dora:

— Talvez, você devesse vestir jeans novamente. Amanhã é quarta-feira, dia em que ele faz compras.

Ao final da tarde seguinte, houve um pequeno e incomum prejuízo nas operações da carteira de ações gerida por ela. A secretária estranhou sua aparente indiferença em relação aos resultados do dia e estranhou, também, ve-la novamente de jeans. 

— … está ao telefone, na linha 2. Posso passar? — Perguntou-lhe a secretária, com algum nervosismo por conta da grosseria do outro lado da linha.

— Não.

— Perdão… "Não"? Mas é o Dr. Arthur, CEO da maior empresa da sua carteira! O que eu digo pra ele?

— Diga-lhe que fui comprar laranjas. — E ela saiu, deixando a secretária atônita. Era a primeira vez que ela parecia não se importar com o que poderia ser um início de crise no trabalho. Mas ela parecia leve.

— Senhor, perdoe, mas ela não pode atender, porque está saindo para comprar laranjas. — A secretária pareceu nem ouvir os insultos do outro lado da linha. Sorriu ao ve-la sair. E reparou como ela ficava bem vestindo jeans.


Luís Augusto Menna Barreto

23 de agosto de 2020

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Um Conto Sobre um Amor Guardado - Parte 7





Parte 7


As palavras de Dora sempre o animavam. Ele comeu as batatinhas no ônibus. Pensando nas pistas que o amor deixa, e onde encontra-las. 

Chegou em casa sem o mesmo ânimo de outros dias, e suspirou antes de abrir a porta, porque de alguma maneira, sabia que encontraria a casa vazia. Entrou. 

O Cointreau estava na mesma medida em que o havia deixado. As laranjas estavam na pequena cesta em cima da pia. Estava sem fome depois das batatinhas da Dora. Sentou-se no sofá, com o peito apertado e pensou: “é tudo tão vazio quando você não está comigo”. Pegou o controle remoto. Passou pelos canais de esportes. Seu time estava jogando. Mas não conseguiu assistir. Levantou-se, colocou o DVD de Shakespeare Apaixonado, e adormeceu antes da quinta cena…

Quando acordou, no dia seguinte, depois do banho, colocou uma das laranjas no lixo, porque começava a apodrecer. Ainda pensando nas palavras da Dora, sobre as pistas do amor, decidiu que usaria seu horário de almoço, no trabalho, para fazer caminhos diferentes…

Trabalhou ansioso pela manhã, e o tempo parecia não passar, entre os enormes rolos de tecido naquele depósito quente em que conferia o estoque. Assim que ouviu o sinal do intervalo de almoço, tirou o jaleco de trabalho apressou-se em direção àquele quarteirão de lojas chiques. Desde pequena, na escola, ela gostava de roupas chiques, que ele dificilmente poderia comprar. Falava de marcas que ele sequer entendia. Mas ele havia juntado dinheiro por um tempo, para comprar taças novas, talvez de cristal, para o cointreau dela. Achou que poderia usar o dinheiro para comprar alguma roupa chique. 

Consumido pela ansiedade, e completamente confuso em frente às vitrines, quase não acreditava nos preços. Algumas peças de roupa que ele achava tão simples eram metade do que ganhava por mês. Algumas, chegavam a custar mais que dois meses de seus salários.

Então, já quase desanimado, e fazendo às pressas, contas de quanto poderia pagar por mês, ouviu de dentro da loja:

— Você?!!!! Não acredito! É você mesmo?!

Foi com espanto, que ele reconheceu Bel, colega de escola, que não via há mais de vinte anos. Ela sorria contente, e veio de braços abertos! Abraçou-o com a saudade de velhos amigos, pegou sua mão e começou a leva-lo para dentro da loja.

— Eu… não sei se é bom eu entrar aí. Acho que esses preços não são pra mim! — Ele disse sorrindo divertido!

— Ah!, não vou deixar você sair daqui sem levar alguma coisa! Eu ajudo você. Venha. Conte-me tudo! O que você tem feito, por onde anda, o que fez esses anos todos e, principalmente: para quem, você estava olhando roupas! Eu vejo paixão nesses olhos! Conte-me!

Ele se atrasou no horário de almoço. Depois compensaria. Sabia que seria repreendido, mas também sabia que era um funcionário terceirizado muito bom, naquele imenso depósito da aduana.

Voltava apressado, com uma caixa linda, levando uma blusa branca de alças, que jamais teria dinheiro para comprar. Mas Bel fez questão que ele levasse, sem sequer deixa-lo propor como pagar. Sobretudo, depois que ela insistiu para ver a foto da mulher que claramente ocupava todo o coração dele:

— Bem… eu só tenho uma foto antiga…

— Mostra logo!

Ele, com cuidado, tirou do fundo da carteira, uma foto quase amarelada… e ela própria reconheceu-se, como uma das três pessoas da foto: era um recorte da foto da turma do 6º ano do colégio, em que estava ele, Bel, e ao lado de Bel, ela. A melhor amiga de Bel, nos tempos da escola.

— Nãããããããoooo… sério?!

Ele sorriu.

— Meu Deus, faz séééééculos que não falo com ela! Você tem de traze-la aqui!

Depois que ele saiu, Bel não aguentou de ansiedade, e, tomada por uma natural nostalgia, procurou o Instagram da antiga amiga, para falar de sua surpresa!


Luís Augusto Menna Barreto

15.8.2020