sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Os Éguas do Edyr

Os Éguas do Edyr


Um dia há alguns anos, menos de vinte, porque eu já morava aqui no Pará, em algum aeroporto, em uma conexão, eu fiquei sem ter o que ler! É, eu sei: vacilo meu!
Daí, fui até uma revistaria na área de embarque, e comecei a bisbilhotar. Um título chamou minha atenção: “Um Crime na Holanda”. Em formato de livro de bolso, avaliei bem e pensei: tenho 2 horas de viagem pela frente, mais uns 40 minutos aqui na sala de embarque… fiz aquela folhada em que as páginas passam rápidas pelo polegar, e decidi: vou levar. 
Naquele dia, fui apresentado ao inspetor Maigret. Foi meu primeiro “Simenon”. Eu confesso (envergonhado) que não o conhecia. Se gostei? Respondo dizendo que hoje eu tenho mais de 40 livros de Simenon, sendo 36 com o inspetor Maigret.
Eu me policio para variar de leitura. Então, raramente leio em seguida duas obras do mesmo autor. (Isso só faço com os gibis do Tex, que coleciono até hoje). Pra quem não sabe, Simenon é o mais profícuo escritor de romances policiais que se tem notícia. Ao ler seus livros, passeamos, tranquilos, pelas ruas de Paris, somos conduzidos pelo inspetor Maigret pelo interior da alma humana, e ficamos inevitavelmente envolvidos pela atmosfera maravilhosa que nos apresenta Simenon. Eu confesso, sem qualquer pudor, que prefiro muito mais Simenon à Agatha Cristie. Prefiro Maigret a Hercule Poirot. 
Atualmente, um autor vem “assombrando" a cena literária europeia e mundial com romances policiais, já tendo mais de uma obra transformada em filmes: Jo Nesbø, com o seu protagonista Harry Hole. Talvez vocês já o tenham lido ou visto em filme, como “O Boneco de Neve”, ou “Headhunters". Um escritor que prende a gente do começo ao fim.  Eu tenho 7 livros dele, faltando eu ler dois, ainda. 
Mas daí, eu fui na Feira Literária do Pará - FLIPA, evento da livraria FOX, em Belém! (Tá, eu também participei com “Pilha & Kadu” e “O Teatro”). Mas o fato é que foi preciso acontecer a FLIPA para eu descobrir vários autores “nossos" maravilhosos. E, quando digo “nossos”, não estou referindo-me ao Brasil como um todo, que tem autores não tão badalados, mas que são brilhantes. Outro dia haverei de falar em Tabajara Ruas, que escreve livros que a gente lê de um fôlego só (certamente tu já viste algo dele, como a série / filme Neto Perde sua Alma). 
Uma outra obra, esta não de ler de um fôlego só, mas de tirar o fôlego: “Oeste" de Alexandre Fraga. 
Estes dois, são maravilhosos, mas não são nossos. Estou falando “nossos" apropriando-me da naturalidade paraense para referir-me a autores daqui, deste distante Norte, do portão de entrada da Amazônia! (E olha que legal, uma matéria no G1, a respeito do lançamento do livro “O Teatro” - (veja aqui a matéria no G1) - classificou-me como “autor paraense” e, confesso, senti algum orgulho disso).
Na FLIPA, bisbilhotando os inúmeros estandes de livros de autores paraenses, eu me defrontei com pérolas da literatura, que eu sequer desconfiava que existiam. Eu já conhecia Inglês de Souza, quem eu considero uma espécie de “José de Alencar” da Amazônia, porque a literatura de Inglês de Souza é quase prosa… é fluida, suave, parece embalar nossa alma ao contar-nos a história, ainda que seja ela cruel e sangrenta, como, por exemplo o conto “A Quadrilha de Jacó Patachó”. Inglês de Souza está num patamar acima, daqueles que são extraclasse. Se algum dia tu, leitor, deparar-te com qualquer obra dele, não vaciles: adquire-a! Há alguns e-books de Inglês de Souza por preços inacreditáveis, como R$ 2,99! 
Também encontrei Dalcídio Jurandir, que tem obras como “Três Casas e Um Rio”, “Marajó”, e “Chove nos Campos de Cachoeira”. Dalcídio escreve com alguma melancolia, que vai tomando conta da alma e remete-nos às agruras e mazelas da vida à beira do rio… literatura imersiva. 
Foi possível encontrar, também, na FLIPA, títulos curiosos como “Armagedon na Cidade do Pará e a Polêmica Ressurreição do Egolecobra”, de Flávio Nassar, um texto burlesco e maravilhoso! Algo entre Garcia Marquez e Dias Gomes.
Mas hoje… ah… hoje eu quero apresentar-lhes outro autor. Sequer eu o conhecia. (Obrigado, FOX, pela FLIPA!). Lembram que comecei falando sobre autores estrangeiros de romances policiais (Simenon, Agatha Cristie e o atual Jo Nesbø)? Lembram que eu comentei sobre Maigret, Hercule Poirot, e Harry Hole? Pois eu gostaria, com profundo orgulho e um mea culpa por não o ter conhecido antes, de apresentar EDYR AUGUSTO PROENÇA. Eu comprei, quase por acaso, na FLIPA, o livro “Os Éguas”. Ora, com um título desses, somente poderia ser paraense, né?! Pois eu quero dizer-lhes que esta obra nada, absolutamente nada, deve a nenhum dos autores citados! 
“Os Éguas”, escrito em frases que dificilmente chegam a duas linhas, com diálogos próprios de quem escreveu muitos roteiros de teatro antes de aventurar-se ao romance, é um livro que não permite que paremos de ler! Uma trama elaborada com fina técnica de juntar pontas aparentemente soltas, um suspense que não antecipa em nada o que virá pela frente, uma escrita muito longe de algum erro piegas de ter obrigação de concertar o final (“concertar" com “c" mesmo, de entrar em acordo, de ter de combinar com o leitor o final). Edyr Augusto coloca-nos a passear pelas ruas de Belém vendo os lugares e sentindo seus cheiros e aromas. Principalmente, coloca-nos a participar da humanidade de seu protagonista, o delegado Gil, tão mais real que qualquer um dos estrangeiros citados. 
Gil é um de nós, alguém que se tornou policial menos por vocação e mais pela oportunidade do concurso público, com a segurança de salário fixo e garantido. Sofre as mazelas da corporação das polícias estaduais, tão abandonadas, com tantos vícios e algumas virtudes lutando na contramão de antigas práticas. Não tem a vocação evidente de Maigret; não tem perspicácia de Hercule Poirot; não tem a infraestrutura da polícia escandinava de Harry Hole. O delegado Gil, tem a experiência que temos, a realidade que vivemos, e as fraquezas que escondemos.
Enfim, descubra-o. Descubra Edyr Augusto Proença e seus títulos tão regionais, mas de histórias que fazem qualquer nacionalidade parar pra ler: “Pssica", "Casa de Cabas”, "Um Sol Para Cada Um”, entre outros.
“Os Éguas”! Uma obra absolutamente maravilhosa. Talvez seu protagonista somente possa ser comparado a um outro, ainda desconhecido: “Tomás”, o investigador de polícia de um romance em construção a 4 mãos (eu e Sandra Carreiro)… ah… mas isso, é pra outra crônica…!

Luís Augusto Menna Barreto

31.10.2019

12 comentários:

  1. Não poderia deixar passar... Como é rico teu texto! Quantas informações! Começas no estrangeito e chega ao Pará com seus traços, sua cultura tão próprias. Uma teia de elogios... Pois olha: fico feliz que tenha sido considerado "autor paraense"... Como se diz por aqui, "bem feito"! E muito feliz que tenhas participado da FLIPA. Uma honra te ler!

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    1. Égua, maninha...! Pior!
      Pense num caboclo feliz! Eu sou realmente muito orgulhoso de estar aqui no Pará, de viver aqui, conhecer as mazelas e belezas, ver as mangas caírem na calçada pregando sustos em nós, sentir o calor do meu sol, afinal, aqui tem um sol para cada um...
      A FLIPA abriu-me os olhos para autores maravilhosos dessa terra de tantas águas...!
      E obrigado demais por vires aqui, deixar teu comentário!!
      Um baita abração!!!

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  2. Demorou...você no G1!!! Que maravilha!!! Isso é muito orgulho pra nós, teus leitores! Você merece demais esse sucesso!
    Parabéns, Poeta!!!!

    Olha...li tudo num fôlego só! E fiquei tão feliz, quando li que gostas do Tex. Eu quase virava a noite lendo Tex. Quase botei fogo na casa, lendo com vela, pra diminuir a claridade e meu pai não perceber. Ah!, tempos bons!!!!
    Agatha Cristie, também li alguns.

    Crônica maravilhosa!!!! 👏👏👏👏👏

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    1. Armelinda!!! Super obrigado!! Eu continuo muito fã de Tex Willer e seus "pards"!!! Leio sempre entre e durante um livro e outro!

      Quanto ao G1, quase não acreditei. Acho que o pessoa da produção da peça de Teatro é muito bom e realiza esses contatos. De qualquer forma, evidetemente que eu fiquei mega feliz! Saiu em outros portais também e nos dois grandes jornais físicos daqui de Belém, e eu fiquei parecendo um pavão orgulhoso!
      Mas o grande barato, mesmo, que sinto, é quando venho aqui no blogue e tem gente deixando recado e aparecendo pra conversar! Isso eu acho maravilhoso demais.
      Estou tentando aprontar algumas novidades literárias... mas também estou metido em um projeto de roteiros de teatro!

      Ah, e deixas eu contar: esse autor, o Edyr Augusto Proença, não é que curtiu a chamada desta crônica que fiz no Facebook!!!! Quase levo um susto!!!!!
      Um dia ainda encontro ele tomando um café na maravilhosa livraria FOX...!!!!!!

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    2. Que bom,Poeta! Ele também deve estar com um "pavão", depois de ver as obras dele tão enaltecidas pelo "Autor Paraense", que já deu seu ar da graça no G1 Notícias! 😊

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    3. Ele é muito maior que isso: descobri que ele já está traduzido em França e outros países europeus e também no Peru! Em França, recebeu um importante prêmio!
      E com o seu romance policial “Pssica” (ainda falarei dele no blogue), recebeu do Estado de São Paulo - o Jornal - o seguinte comentário: “o romance policial do ano”!

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  3. Genteee!!! Texto maravilhoso!! Rico!!Que lindo o título de "Autor paraense"...Super merecido!! Eu amei essa crônica!! Fiquei curiosa para conhecer alguma obra de Simenon!!

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    1. Ah!, Michele... queres passear por Paris com o inspetor Maigret....! Simenon é fantástico! E, embora este não seja um título com o inspetor Maigret, eu recomendaria "Carta a Meu Juiz" de Simenon. Uma história incrível!

      E suuuuper obrigado por vires aqui conversar no blogue!
      Eu realmente gostei do "titulo" de escritor paraense!!!

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  4. Confesso, meio envergonhada, que mesmo gostando de ler, leio pouquíssimo e não conheço quase nada na área literária. Amei a matéria a seu respeito no G1,parabéns.

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    1. Ah... mas tu tens o principal: GOSTAS DE LER!!!!!! Esse é o primeiro passo!!!
      Daí, é só experimentares um ou outro gênero de leitura pra ir descobrindo o que mais te atrai... daí, dentro d gênero, os autores.... e pronto!!!
      Rsrsrsrsrs
      Mas eu fico feliz e orgulhoso mesmo, é que tu és uma das minhas mais assíduas leitoras!!!!!😍😍

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  5. Na época da escola, li uma obra de José de Alencar, não lembro qual, li Mar Morto de Jorge Amado; li também as obras da nossa amiga Ana Isabel. E tudo que você escreve é uma magnífica leitura. Amo tudo isso.

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    1. Viste só?! Tu lês muito!!!!!!!!
      José de Alencar é um dos meus ídolos!!!!!!

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