Sinceramente, se nosso país fosse mais sério com a saúde, se tivéssemos bons investimentos em ciência, se nossos governantes realmente se importassem com a população, eu tenho certeza que o Marajó estaria, neste momento de pandemia, sendo estudado.
O Marajó, no início da pandemia, fora notícia nos veículos de comunicação, pela altíssima taxa de contágio. Vamos esclarecer que no Marajó, há o Hospital Regional em Breves (a maior cidade do Marajó, com mais de cem mil habitantes), mas nas demais cidades da Ilha, os hospitais são lamentavelmente precários.
Muito já contei aqui nas crônicas de Marajó City, dos percalços da ambulância, em que raríssimas vezes efetivamente transportou enfermos. Sendo o hospital a menos de quinhentos metros do trapiche municipal, muito mais se levam os enfermos na maca, para embarcarem para tratamento em Belém (rezando para que resistam às mais de 10 horas de navegação em rios que parecem mar), do que se os transportam na ambulância. Não que seja mais trabalhoso levar o enfermo na ambulância, do hospital ao trapiche… O problema é o motorista, o Manobra! Não que seja difícil encontrar, é até simples: basta ir no açougue do Retalho, ou no Bar do S. Nonô. O problema é ele estar sóbrio a ponto de encontrar a chave da ambulância!
Pois bem, mesmo com este cenário de precário atendimento da saúde pública, o fato é que a taxa de óbitos por COVID no Marajó não foi tão grande. Pelo contrário. Se de um lado houve muita contaminação, de outro, os óbitos foram proporcionalmente baixos.
Já no início da pandemia, como eu disse, meus amigos todos no Marajó, haviam sido contaminados! Mas não houve lockdown por lá. Como se poderia esperar, o Marajó, com suas peculiaridades, encontrou sua maneira! As festas, ao contrário de todo o resto do Brasil e quiçá do mundo, continuaram. O que aconteceu, foi que passaram a ter festas para quem estava testado positivo e festa para quem estava testado negativo!
Já no começo, as festas disputavam pessoa a pessoa, quem registrava o maior número! Mas, com pouco tempo, as festas dos positivos passaram a dar mais gente. Logo, não houve mais festas para os que não haviam, ainda, sido atingidos pelo vírus. O “Xérica" ganhou um bom estoque de açaí, vendendo falsos atestados positivos, para que os negativos pudessem entrar nas festas. Casais foram desfeitos por conta de resultados de exames. Os caboclos rejeitando morenas testadas negativas, porque não poderiam namorar. Morenas dispensando caboclos testados positivos, acusando-os de terem sido contaminados por fazer saliência com quenga positiva!
Fato curioso foi na questão religiosa: Os Padres da cidade, ciosos de cuidarem-se acabaram não contraindo a COVID. Daí que avisavam que na missa só poderia ir quem estivesse negativo e sentando duas pessoas a cada banco. Os pastores das igrejas evangélicas, por sua vez, aproveitaram o momento: declararam-se positivos, e anunciaram que os cultos estavam abertos aos positivos. Pra não deixar de cumprir obrigação religiosa, houve uma onda de conversão.
Quem apostou na pandemia, acabou por se dar mal no Marajó. O Quebrado foi um deles. Antes, um esperto comerciante atento às oportunidades, nascido Abraão Antônio de Deus, foi um dos primeiros a prestar atenção às notícias de que o Marajó estava com uma das mais altas taxas de contaminação do país. Pois lá foi, com um estoque pra mais de dez mil máscaras compradas na 25 em São Paulo. Atravessou o país, com seu carregamento de máscaras, e tratou de alugar um espaço na rua da Beira, bem na frente do trapiche do Leão do Marajó! Não conseguiu vender nem para o aluguel, e em menos de um mês, já ganhou o apelido de “Quebrado”.
Mesmo com toda a contaminação, o fato é que só se via máscaras nos funcionários da Justiça Eleitoral e no posto da Receita Federal.
Mas nem tudo foi esquecido pelo povo Marajoara! O álcool gel, por incrível que pareça, foi adotado pela população. Até nas rodas de cerveja, sempre tinha alguém que levava o vidro de álcool gel para benefício de todos. E foi daí que o Goela foi parar no hospital!
Em pleno dia de Natal!
Pois o caso é que o Goela, em recesso do fórum, estava com vários amigos tomando umas! Umas não: várias, na verdade! E o vidro de álcool gel ali na mesa, passando de mão em mão.
No começo, nunca tem problema! Como vários pegam as garrafas, o álcool vai sendo passado de um para o outro. Gel na mão, pega a garrafa e serve mais uma rodada… e assim vai.
O problema é que pelas sei lá qual rodada, o Goela (como vários) já estava ficando porre. As histórias de que o sujeito acaba “trocando as bolas” e bebe álcool no lugar da cerveja, já é lugar comum no Marajó. Mas não foi por isso que o Goela acabou no hospital. Beber o álcool em vez da cerveja não mata ninguém. O problema do Goela foram as costelas quebradas!
Ele fez o contrário: pegou a cerveja e derramou nas mão como se fosse álcool gel! E isso não é perdoado! Acabou pegando porrada por desperdiçar a cerveja!
Luís Augusto Menna Barreto
25 de dezembro de 2020.