Contículo de Uma Pequena Tragédia
E deu-se uma pequena tragédia…
Ela definhava a olhos vistos, em frente ao quarto que alugara por tanto tempo. Sentada na calçada.
Muitos pensaram, dela, uma indigente. Quando fora despejada, porque o novo proprietário ali construiria um novo prédio comercial, demolindo o pequeno sobrado de quartos velhos sem janelas, ela se agarrou no cobertor que ficava sempre em sua cama, enrolou-se e simplesmente sentou na calçada do outro lado da rua… e passou ali, vendo o sobrado ser demolido…
As pessoas desviaram dela na calçada… Uma ou outra, largou moedas na frente dela, para o quê, ela olhou com indiferença.
Morara muitos anos ali. Era bastante reclusa. E via o mundo, fora do trabalho de dez horas na pequena lanchonete onde fazia hambúrgueres e cachorros quentes, pela tela do celular. Horas e horas, falando ao telefone, ou teclando em aplicativos de conversas. E suas testemunhas, eram aquelas velhas paredes que davam espaço para sua cama, o guarda roupas e um pequeno frigobar. Da sua vida, sabiam as paredes! Foram confidentes, ouvintes, foram voyeurs de concreto.
Como seu mundo particular, onde era ela mesma, eram aquelas quatro paredes. Ao trabalho, ia como um autômato: não conversava, não ria, não interagia. Fazia os hambúrgueres, conforme os pedidos chegavam, em uma eficiência quase mecânica. Em mais de dez anos na mesma pequena lanchonete, mal sabiam seu nome.
… mas aquelas paredes.. ah!, sabiam seus segredos… viram a intimidade das fotos que enviava… viram as expressões que usava. Viram o suor de seu corpo em conversas que seriam impublicáveis…. Aquelas paredes sabiam e poderiam retratar toda sua vida.
Então, vendo as paredes serem demolidas, nenhuma outra parede buscou. Apenas resignou-se a sentar no outro lado da rua. Por dias, não fora sequer trabalhar.
Permaneceu ali.
Era uma corrida… uma prova de resistência. Quem pereceria…? Ela, ou as paredes que lhe eram o relicário de si própria…? Olhava sem expressão. E seria impossível decifrar seu olhar e seu coração. Talvez, somente as paredes que se acabavam a marretadas, pudessem sabê-la.
Enfim, a última marretada fora brandida… e desferida!
…
As paredes, enfim tombaram… antes dela!
Largou o cobertor. Sentiu-se livre! Decidida a viver uma nova vida. Não fora qualquer sentimento de apego que a mantivera ali, vendo as paredes serem demolidas. Quis, apenas, ter a certeza que seu passado fora apagado.
Simplesmente levantou-se e começou a caminhar. Decidida a encontrar um lugar com janelas grandes.
Por Luís Augusto Menna Barreto
Seja bem vindo amigão. Depois das férias,mais um belo conto. A rotina lhe trazia tristeza e solidão. Quando se viu livre,acreditou que o novo poderia ser incerto mas lhe trazia esperanças de um mundo melhor, apesar dos desafios. Então foi... não olhou pra e como se diz "seja o que Deus quiser".
ResponderExcluirAh, amigão... e sei que tu, mais que ninguém, sabes: se for o que Deus quiser, será o bom, o justo e o certo!!
ExcluirPARA UM RECOMEÇO, UM FINAL TEM QUE ACONTECER. O desapego sempre envolve sofrimento. Lindo o contículo, adorei sua volta poeta 👍👍👍👍
ResponderExcluirE como é bom voltar recebendo gentileza!!
ExcluirBora quebrar umas paredes que nos aprisionem! Vamos erguer casas sem muros e com janelas generosas!
Seja muito bem vindo de volta, Poeta!
ResponderExcluirMuitas vezes precisamos desapegar... enfrentar a dor do fim... e seguir em frente com coragem.
... às vezes, tudo que precisamos, é de janelas...!!!
ExcluirComo é bom receber tua gentileza, guria!!!!
Voltei com algumas idéias na cabeça!!
... aguardem (como diria um maravilhoso e longevo comunicador de televisão)
Estou aguardando... ansiosa!!!
ResponderExcluirMas muito obrigado!!!
ExcluirGosto das letras! E aprecio muito quem se apaixona por elas!!!
Gostei! Gostei mesmo. E gostei mais foi encontrar no pequeno conto o que em ESTILÍSTICA é chamado de "QUEBRA DO GRAU ZERO PRÁTICO", ou seja, a quebra da expectativa.
ResponderExcluirVeja: no conto, não existe a vida e, depois, o fim; o que existe é o quase nada e, no fim do conto, o INÍCIO DA VIDA.
Abraço, amigo querido!
Feliz retorno!
Mas bah!!!!!!!
ExcluirAprecio sempre teus comentários, e aprendo com cada um deles!!!!!!
Realmente nunca havia ouvido falar desse conceito: “quebra do grau zero prático”!
Gostei de haver escrito o contículo, também porque a ideia não era de terminar... .... mas de ser uma “introdução”!
Se tudo correr como penso, esse pequeno será, de fato, um prólogo em Feedback, pra algo já escrito há muito...! Mas por enquanto, acho que ele também funciona assim, em modo “solo”...!!!
Lindo conto!!!! A demolição representando não a destruição, mas a construção de uma vida nova!!!
ResponderExcluirA ideia foi essa!!!!! Ah!, tão bom que visitaste!!
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