bora cronicar
Eles Estão Por Toda a Parte!
A primeira vez que eu vi um deles, eu estava no médico, na sala de espera! Na hora, não entendi muito bem do que se tratava, porque a gente nunca espera que eles estejam ao nosso lado…
Não havia muita gente. Havia eu e mais três pessoas. A sala era pequena e havia cadeiras dos dois lados, encostadas em ambas as paredes. Havia seis lugares, dos quais quatro estavam ocupados. Naquela época, começo da década de 90, não havia smartphone. Quando muito, aqueles motorolas enormes, pesados, que quando tocava a gente tinha de abrir o flip do bocal de voz e puxar a antena. Numa sala de espera o que fazia passar o tempo eram as revistas antigas que sempre havia: “Manchete”, “Contigo" e, com muita sorte, “Veja”. Então, naquele tempo, realmente era mais difícil disfarçar. Alguns deles, não conseguiam.
Hoje, com smartphones, e-readers e nitendos portáteis, eles conseguem enganar-nos com mais facilidade. Mas ainda assim, às vezes, algum deles não resiste e então acontece!
Consultórios médicos e odontológicos são os locais onde mais se tem notícias das ações deles. Relatos inúmeros dão conta de serem os locais onde mais houve ocorrências, onde mais eles se revelaram. Raros salões públicos tem registros deles em ação. Preferem agir em locais pequenos.
A ação é, em princípio, discreta, quase furtiva. Mas do momento em que eles se sentem seguros a revelar-se, do momento em que decidem partir pra ação, não há o que os impeça. Não há, na literatura especializada sobre as ações deles, nenhuma notícia, absolutamente nenhuma, de que não tenham conseguido completar sua ação.
Se tu já passaste por esta situação e ficaste sem ação, paralisado, e, ao fim, apenas concordaste, não te envergonhas! Os especialistas explicam que esta é a reação (ou falta dela) de noventa e cinco vírgula quatro por cento das vítimas. Sentem-se constrangidas no início, uma paralisia perplexa ao ve-los em ação e então, a reação natural de é concordar quando eles te encurralam. Tu não lutas contra eles. Não há o que os detenha.
Às vezes agem solitários, mas, muitas vezes, agem em bandos. Normalmente todos já viram, todos mantem os olhos fixos… ou ao menos dão olhadas furtivas, no início. Até que simplesmente passam a encarar. Eles não combinam, mas é algo instintivo: assim que o primeiro passa à ação, é apoiado pelos demais. Foi assim quando eu vi o primeiro:
Ele estava, como eu iniciei falando, ao meu lado. Eu jamais poderia esperar. Quando eu cheguei, havia uma senhora sentada de costas para uma das paredes, ao lado de uma mesa onde havia revistas e, na parede, um quadro onde havia um barco lutando contra águas agitadas. Havia duas cadeiras vazias ao lado dela. Eu sentei quase na sua frente, no lado onde as três cadeiras estavam desocupadas. Não porque eu desconfiasse que ela fosse um deles! Era impossível desconfiar. Nós nunca os reconhecemos antes de ser tarde demais, antes deles entrarem em ação. Sentei na sua frente, porque pareceu o mais lógico e natural.
Depois, entrou um senhor. Uns 40 anos. Bem vestido. Do tipo que tu olharias e poderias confiar, poderias perguntar as horas, puxar uma conversa, até falar sobre a última notícia que o Cid Moreira havia dado ontem! Como eu poderia adivinhar? Sentou-se bem ao meu lado, na minha direita, quase em frente à mesinha das revistas. Pegou uma “Manchete" e começou a folhar. Eu até achei que ele havia levantado os olhos da revista uma ou duas vezes, mas não desconfiei de nada até aquele momento.
Logo chegou um outro senhor mais idoso, talvez 60 anos. Sorriu. Cumprimentou a todos e falou que estava começando a ventar muito na rua, e achava que iria esfriar no final da tarde. Como eu poderia desconfiar deles? Nada dava a entender que estariam sequer juntos… como eu era ingênuo! Mesmo que não estivessem juntos, assim que o primeiro agisse ambos se uniriam. É instintivo deles!
Foi então que o homem que havia sentado na minha direita suspirou olhando fixamente à frente. Baixou a revista. Tornou a levanta-la tentando disfarçar mas parecia ser mais forte que ele. Eu notei que ele estava quase ofegante. Um arrepio percorreu-me. Então, ele olhou para o senhor idoso que estava ao meu lado esquerdo e, depois, ambos olharam fixo para frente, para o mesmo ponto. Era tarde. Eu estava entre os dois. Não poderia fazer mais nada a partir daquele ponto! A senhora que estava na nossa frente notou, como eu, os olhares. Eu me apiedei, temi por ela. Então, a surpresa! Ela sorriu para eles e balançou a cabeça em cumplicidade, virando o rosto para o mesmo ponto!
Foi com algum desespero que eu me vi cercado! E então, sentindo-se completamente seguros, depois de entenderem que os três estavam de acordo o homem ao meu lado levantou-se, passou à ação. Eu congelei, constrangido. A recepcionista parecia anestesiada e não viu a cena, ou, talvez, já tenha visto tantas vezes que nem mais se importava. Aconteceu: o homem levantou-se, caminhou dois passos, colocou muito levemente dois dedos na parte externa da moldura do quadro na parede e empurrou alguns milímetros!
O senhor velho da esquerda olhou fixamente, em dúvida. A mulher de costas para o quadro levantou-se, foi até minha frente, quase sem importar-se com meu constrangimento, e espremeu os olhos:
— Mais um pouquinho pra esquerda… não, foi muito… isso! Aí. Perfeito!
Então, sentaram-se os três, como se nada tivesse acontecido, todos satisfeitos e vitoriosos.
Eles são assim: não se constrangem! São aquelas pessoas que não podem ver um quadro torto na parede! Não importa se é a sua parede, a do consultório, a da estação do trem, ou da sua casa! Eles simplesmente não conseguem conter-se!
Eles são os portadores do transtorno obsessivo obsessivo obsessivo obsessivo compulsivo que não conseguem ver um quadro torto na parede que precisam arruma-lo!
Ou eles arrumam, ou o mundo parece torto!
…
A propósito: na minha casa existem 15 quadros nas paredes, rigorosa e milimetricamente alinhados.
No meu gabinete, no trabalho, há 9 quadros, mais 4 na assessoria, mais 3 na sala de audiências… Pense no meu desespero quando a Ana vem visitar-me!
Luís Augusto Menna Barreto
18.6.2019
Ai Poeta, você fez um suspense!!! Hahaha...Eu tenho quase certeza que sou um deles, só não fui diagnosticada clinicamente...rsrsrs...Eu verifico a porta de casa mil vezes antes de sair,Levanto várias vezes pra olhar se apaguei as luzes e por aí vai...🙄🙄
ResponderExcluir😱😬
ExcluirTu tambeeeeemmmm!!!!
🏃🏻♂️..................🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️👀
🤣🙄🤦
ExcluirAaaahhhhhhh......🏃🏻♂️...🖼.........🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️
ExcluirMuito bom kkkkkkkkkkkkkk!!! Eu fico agoniada demais quando vejo quadro torto. Livros desalinhados, e por aí vai!!! Abraço!
ResponderExcluirMeu Deus!!!!! E eu cheguei a sentar do teu lado na missa...!!!!
Excluir....🏃🏻♂️.......🖼.......🏃🏻♀️🏃🏻♀️🏃🏻♀️👻😱😱
Verdade!!! Que tempo bom meu amigo!!! Muita saudade!!! Claro, tirando o riso incontrolável na hora errada, a missa era perfeita!!! E sofro desse mau até hoje!!! Que teu dia seja iluminado!!!
ExcluirNão serias tu, sem teu riso...!!!!!!
ExcluirAi poeta, que suspense, achei que ia falar que ETs estão entre nós, em todos os lugares kkkkkkkkkk mas, são só os portadores de TOC, ufa, de acordo com a descrição, sou NORMAL, graças a Deus, ou pelo menos nunca percebi nenhum sintoma mais severo kkkkkkkkkk. Parabéns, vc aguçou a curiosidade e fez com que a gente lesse até o final, afim de descobrir que seres são esses que vivem entre nós, características de um bom novelista. Suave o cronicar de hoje. Muito bom.
ResponderExcluirAh!, Nice, depois de ontem, merecíamos uma crônica leve, né?!
ExcluirA Lola veio aqui, no final do expediente, trazer-me uma deliciosa xícara de café. Daí, conversamos sobre a postagem (pesada) de ontem, e eu expliquei que aquele tipo de postagem é muito mais difícil pra mim, tanto quanto escrever o Pilha ou o Kadu... exige muito mais... Ela perguntou sobre as crônicas e eu falei. "Ah, crônica é tranquilo, porque a gente pega qualquer pequeno fato cotidiano, e fala sobre ele de forma mais leve, por exemplo, dá pra fazer crônica do quadro torto na parede..."
Pronto... foi eu falar isso pra Lola revelar-se! Ela foi até os quadros e começou a ajeitar um por um... daí, surgiu essa crônica levinha!!!!
Aco que vou chamar a Lola aqui, para dar a inspiração da crônica de amanhã!!! rsrsrs
Blz
ResponderExcluir😁🤗
ExcluirPorra! Tu me apavoraste, Seu Juiz! Isso é quase crime.
ResponderExcluirFiquei até com vontade de cantar uma musiquinha que os jagunços cantaram a noite inteira, na frente da casa do JUIZ, lá pela terceira década do sec. XX, nas Lavras Diamantinas - BA.
E vou cantar! A melodia te ensinarei, quando te vir:
"Da Bahia me mandaram
Mineiro-pau, mineiro-pau
Um presente no canudo
Mineiro-pau, mineiro-pau
Uma velha descascada
Mineiro-pau, mineiro-pau
Um JUIZ com casca e tudo.
Seu doutor que está dormindo
Mineiro-pau, mineiro-pau
Burro assim nunca se viu
Mineiro-pau, mineiro-pau
Juizim fi duma puta
Mineiro-pau, vai a puta que o pariu."
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Gostei MUIIITO, LUÍS AUGUSTO!
Bela técnica. Este é um novo estilo que inauguras.
XXXXXXXXXXXXXXXXX
SEGREDO: tenho poucos TOCs (acho mesmo que todo mundo tem algum), mas esse do quadro torto é o que mais me dá trabalho para vencê-lo.
Quem é O futuro presidiário que fez essa musica aí...??????!!! 😱😂🤣😅
ExcluirAh!, Escritora.....!!! Foi divertido, não foi, o enredo dessa!!!!😁😁
Não leste não?
ExcluirForam os jagunços, na década de 30, do sec. XX.
Já estão todos presos, no cemitério.
Bora prender quem anda reproduzindo...! rsrsrsrsrs
ExcluirQue suspense genial, confesso que fiquei tão aflita que corri ao final da crônica para saber quem eram eles!!!Hahaha, muito legal, adorei!! Estou longe deles, graças a Deus, por aqui tudo tranquilo! 😄😄😄😄
ResponderExcluirAh.... Denise, tu não imaginas minha felicidade ao ver um quadro torto na parede, sem ninguém aflito pra arrumar......... antes de mim!!!!🤣😂!!!!!!
ExcluirHilário, uma crônica para inchar a curiosidade e esvaziar em uma única expirada, fazer da agonia do suspense ao alívio uma viagem relâmpago, muito boa essa leitura de hoje, para alegrar o espírito 😊
ResponderExcluirFoi uma pequena incursão no suspense....!! Mas foi bem divertido, Lola...!!!!
ExcluirEstão mesmo!!!! 😊
ResponderExcluirMinha mãe fica furiosa, quando estende roupas no varal, comigo por perto. Por quê? Simplesmente, porque ela mistura tudo...e...eu não aguento...vou lá e separo calça com calça...camisa com camisa...bermuda com bermuda...e por aí vai... 😊 Não é por mal...é mania mesmo, Poeta!
Ai ai ai.... até dentro de casa eles estão....!!!!
ExcluirSocooooooorro!!!
(Como é bom ver-te por aqui!!!!)