bora cronicar
O Filho do Relege, o Mariposa e a Moto - parte 2
O Mariposa estava furioso. Por vários motivos.
Primeiro, pelo fato de que não conseguiu desembarcar a moto. Tinha sonhado em sair do trapiche fazendo bafo, acelerando e com todos vendo. Sabia que seria o assunto da cidade quando amanhecesse.
Agora, depois do que aconteceu, ele sabia que seria, sim, o assunto da cidade. Mas não por ter descido o trapiche, triunfante pilotando a moto; seria porque nem conseguiu desembarcar! Tinha vontade de afogar o Relege e o filho abestado, que atirou no próprio pé. O consolo é que pelo menos, se ele não desembarcou, o moleque não embarcou. Mas o problema é que ele perdeu o dia inteiro. Eram mais ou menos 4h da madrugada quando ele tentou desembarcar a moto, e a maca com o moleque impediu! Por volta de 8h o navio chegou em Breves, de onde somente zarparia em retorno para Belém, às 18 horas. Então, por volta de 22 horas ele estaria finalmente no mesmo trapiche onde a confusão ocorreu.
Como o Mariposa estava chegando de Belém, já estava quase sem dinheiro, mas tinha uma nota de cem reais para alguma emergência. Era uma emergência. Pelo menos poderia comer alguma coisa durante o dia, pensou. Foi então que quase teve um ataque de nervos: o Tapioca, marujo do navio, veio cobrar a passagem.
— Que passagem? Que passagem? Já paguei o raio da passagem!
— A passagem de ida e volta até Breves! A sua não incluía ida e volta até Breves! Foi o comandante que mandou.
— O quê? Tu tá louco, Tapioca? Eu ia descer e o abestado do comandante que já foi logo zarpando! Não vou pagar coisa nenhuma, quié?!
E o Mariposa, na sua fúria, já foi dando uns empurrões no pobre Tapioca que não era lá essas coisas em termos de vantagens físicas.
O Mariposa ainda tava soltando fogo pelas ventas, quando o Canhão chegou perto dele:
— Passagem! — e estendeu a mão. Não falou mais nada.
O Mariposa estava furioso. Mas não tinha perdido o juízo. O comandante deve ter mandado o Canhão de propósito. E ele não seria doido de puxar briga com o Canhão! Foi que o Mariposa entregou a nota pro Canhão que pegou e virou as costas sem dizer nada. O Mariposa ficou, evidentemente, esperando o troco, já que naquele tempo, a passagem até Breves era vinte reais. Ida e volta, quarenta, e assim mesmo, se é que teriam coragem de cobrar ida e volta.
O Mariposa passou a manhã inteira ao lado da moto, no convés do navio. Mas quando estava perto do meio dia, já estava com muita fome e resolveu que sairia rápido para fazer algum lanche na beira. Daí foi atrás do Canhão que até aquela hora não havia voltado com o troco.
Achou o Canhão deitado em uma rede no convés superior.
— Égua Canhão. Nem pra levar meu troco?
O Canhão mal levantou o rosto da rede:
— Não tem troco.
— Bateu a cabeça, Canhão? Dei cem reais! Como não tem troco?
— Frete.
— O que? O que você tá falando?
— Frete da moto ida e volta até Breves. Trinta pra ir, trinta pra voltar.
Disse isso e se virou na rede, dando as costas para o Mariposa que entendeu que a conversa estava encerrada!
Aí, sim, o Mariposa estava soltando fogo pelas ventas! Amaldiçoou mil vezes o Relege e o filho; rogou praga para que o pé do garoto nunca mais endireitasse!
Depois, pensou melhor: o Relege era vereador, afinal de contas, e o Mariposa um dos maiores comerciantes locais. Resolveu retirar a praga rogada. Decidiu que a culpa era dos carregadores da maca e do Manobra que deve ter demorado com a ambulância!
Amaldiçoou o enfermeiro do hospital, os técnicos, o Manobra e até a ambulância o Mariposa amaldiçoou, rogando praga que batesse na próxima viagem! Amaldiçoaria o Canhão, mas considerando o tamanho dele preferiu resignar-se. E assim, com a raiva aumentando junto com a fome, o Mariposa passou o dia ao lado da moto, até o navio partir de Breves. Por volta de 22 horas, o Canhão amarrou o cabo de atracação no trapiche municipal.
A essa altura, o Mariposa já havia falado muito com o comandate pra deixar ele desembarcar a moto sossegado. Daí que depois de todos entrarem e saírem, houve toda a função de colocar a moto na prancha (uma tábua mais fina, porque a outra havia caído na água e ninguém foi pegar), equilibrar e fazer sair.
Quando a moto estava no trapiche, o Mariposa finalmente sentiu alívio! Não era como esperava, porque, afinal, tirando a moto depois de todo mundo haver saído, já não haveria movimento de gente pra ver a saída triunfal do trapiche. Mas, considerando tudo o que houve, o Mariposa queria mesmo era chegar em casa e descansar.
Eis, entretanto, que o inusitado deu-se: ao descer a rampa do trapiche, foi dobrar à esquerda, ocorreu o infortúnio: vinha a ambulância, como sempre atrasada, para levar enfermo ao navio. E o Mariposa, exausto, com fome e sem habilidade, ainda, na moto, colheu ou foi colhido pela ambulância. Moto para um lado, em queda, e o Mariposa foi parar perto da traseira da ambulância, bem onde sairia o enfermo!
E foi, que o Mariposa gritava no chão para atende-lo, e o enfermo gritava de dentro da ambulância para que o levassem ao navio.
Quando o Manobra e o enfermeiro pegaram a maca, o Mariposa, já sentado no chão, segurou na ponta da maca. De dentro, o enfermo segurou na outra e começou o empurra-empurra: o enfermo querendo sair da ambulância na maca, e o Mariposa querendo entrar na ambulância na macal!
…
O navio partiu sem esperar a resolução do problema. E o enfermo era o Relege, que, vendo o rebento pular em um pé só, na noite anterior, passou mal, subindo-lhe a pressão e exigindo transferência para Belém, tendo esperado o dia todo pelo navio…
Por Luís Augusto Menna Barreto
24.5.2019
Eitaa!! Que dia!! Hahaha( Rindo com respeito)
ResponderExcluirAcho que o Mariposa está "pagando" por tudo que aprontou, deixando a Constante pela Pequena, e depois enrolando a Pequena também, naquela história do perfume, lembra...
ExcluirAh... isso vai virar o comentário da cidade, em Marajó City...!
Amigo, muita confusão pra um só dia. Como dizem no interior o Manobra tem que tomar um bom banho, pra sair a pisica. Legal.
ResponderExcluirrsrsrsrs.... também acho... e acho mesmo que vai sobrar pro Manobra nessa história toda!!!
ExcluirObrigado pela visita no blogue, amigão!
Meu pai de misericórdia, pra quem tava planejando se exibir, com a moto nova, desandou geral, coitado kkkkkkkkkkkk E não é que a praga pegou no Relege mesmo? Vixe! E a história continua. ...
ResponderExcluirTo achando que vai sobrar pro Manobra.......
Excluir... Bora, Nice, pro bar do Seu Nonô, ou no açougue do Retalho, que lá é que vai ter a fofoca rolando!! Bora.....
Que confusão este Mariposa fez, rsrs mas tive pena dele. Ficou sem comer. Não tem como não rir, roga praga, tira praga.😂😂😂 e este Canhão? Pelo apelido imagino cara do sujeito e seu tamanho. 😂😂😂
ResponderExcluirO Mariposa deve estar pagando pecados....! Ele aprontou pra Constante, em crônicas anteriores, lembras...?!!
ExcluirQuanto ao canhão.... digamos que não é o sujeito mais lindo e polido....!!!!😁😁
Muito legal!
ResponderExcluirQuanta novidade eu dizer isso, né?
Abraço, Meritíssimo!
Ahhhh..... mas meus olhos sempre leem como uma deliciosa novidade!!!!
ExcluirApesar de tudo que o Mariposa já aprontou...ainda assim, fiquei com pena dele. A coisa desgringolou sem dó pra o lado dele. Precisa ir atrás da benzedeira da outra crônica! 😂😂
ResponderExcluirPois não é....?! Mas olha.... eu lembro que a benzedeira levou cinquentinhas meu no mole!
Excluir