domingo, 24 de novembro de 2019

O Escritor

O Escritor

Ele escrevia. Às vezes, depois do trabalho, às vezes à noite, quando a esposa e os filhos dormiam… Foram inúmeras vezes que, embora cansado, vinha-lhe uma idéia na cabeça, e então, ele esperava que dormissem, fazia um café quase em silêncio e punha-se a escrever.
Eventualmente, publicava algumas linhas em redes sociais. Havia, sempre, quem fizesse algum comentário. Com o tempo, foi criando uma pequena rede de amigos. Amigos virtuais, que passaram a ler seus escritos e passaram a acostumar-se com o ritmo do que ele escrevia, que riam, emocionavam-se, quase mesmo participavam de suas criações.
Diziam-lhe uns, que ele tinha talento. Ele mesmo achava que tinha. Escolhia, sempre, com cuidado as palavras. Algumas vezes, ficava como que ruminando em sua mente uma ou outra frase, porque não a entendia pronta. Ou porque achava que a frase estava boa demais para que fosse postada sozinha, sem haver todo um texto que justificasse a existência daquela frase.
Algumas vezes, os textos ficavam com ele tanto tempo, sem irem para o papel, que chegava a criar uma espécie de intimidade com o texto e, ao escreve-lo, parecia a despedida de um amigo que faria falta. 
Ele não vivia dos seus textos. Trabalhava. Mas o inevitável sonho era viver de sua literatura. Às vezes, irritava-se, sem qualquer modéstia, ao ver uma frase pobre ganhar notoriedade da noite para o dia em redes sociais, escrita por uma pessoa que sequer se preocupava tanto com as palavras, como ele. De alguma forma, ele se abatia ao ver tantos livros escritos por pessoas que ele tinha certeza que não tinham um mínimo de talento, um mínimo de respeito pela literatura. Pessoas que, de alguma forma, estiveram no lugar certo, na hora certa, fizeram-se descobrir, algumas vezes até mesmo pela vulgaridade com que se exibiam, e tinham livros de parcas idéias, de histórias comuns, de pobre literatura, tão vendidos…
Tantas foram as vezes em que ele quase desistiu. Em alguns momentos chegou a ficar sem escrever por semanas… mas era sempre vencido, como se as palavras escritas fossem-lhe um vício. 
Sonhava. Sonhava que um dia, a literatura de qualidade que ele sabia fazer, seria descoberta, que então seriam os seus livros nas prateleiras; que um dia, seria reconhecido pelo cuidado de uma vida, com as palavras. 
… sua vida, porém, foi passando entre escritos quase anônimos, e elogios de alguns amigos fieis às suas publicações em redes sociais. 
Já em tempo de espera e preparando-se para a morte que encarava como uma fato natural, catalogou tudo o que escreveu e deixou arquivado, com uma carta para a esposa e filhos. Tinha a convicção de que a posteridade seria sua redenção! Que os filhos e a esposa viveriam, ainda, as benesses faustosas de seu legado literário.
Morreu. Havia quase um sorriso ao pensar em sua família encontrando a carta com as orientações que deixara. Depois de velado, a esposa foi ao seu pequeno escritório em casa, cheio de livros, papéis, revistas… e encontrou a carta, junto com duas grandes caixas de material que ele catalogara. Ela pegou a carta com carinho. Leu detidamente… olhou as caixas…
… suspirou. 
“Era um sonhador”, ela pensou com carinho sincero.
Alguns anos depois, quando ela se mudou para um apartamento menor, porque os filhos haviam, já, alçado seus vôos próprios, as caixas estavam, ainda, lá, e eram grandes demais para o pequeno apartamento novo.
“Se a senhora quiser, podemos levar para a cooperativa de reciclagem dos catadores”, ofereceu o motorista da empresa de mudança.
Ela assentiu com um gesto de cabeça, separando apenas a carta.
“Era um sonhador”, pensou.
Luís Augusto Menna Barreto

22.11.2019

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Quinto Micro Conto de Amor

Quinto Micro Conto de Amor

Desde o dia em que se conheceram e apaixonaram-se irremediavelmente, ele passou a dizer-lhe “eu te amo” todos os DOMINGOS.
Passaram a namorar e ele ligava para o trabalho dela, na farmácia onde a conhecera, todas as SEGUNDAS-FEIRAS, bem cedo, para dizer-lhe “eu te amo”.
Ao ficarem noivos em uma comemoração simples, em que trocaram alianças na mesa da calçada daquele bar, entre alguns amigos, todas as TERÇAS-FEIRAS ele lhe enviava mensagem dizendo “eu te amo”.
Ao casarem naquela igreja de periferia, numa cerimônia em que os amigos ajudaram a realizar, todas as QUARTAS-FEIRAS, ele deixava um bilhete escrito “eu te amo” junto à garrafa térmica com o café que preparava às 4h30, antes de sair para sentar-se no banco de cobrador do primeiro ônibus que partia da garagem.
Tempos depois, ensinou pelo exemplo, aos filhos, a dizerem, todas as QUINTAS-FEIRAS, “eu te amo”, para ela, que era uma mulher e mãe com uma vida simples, porém feliz.
Já perto do ocaso de ambos, quando ele acordava, às SEXTAS-FEIRAS, agora já aposentados, ele dizia “eu te amo” a ela, antes de ligar aos netos para ambos o dizerem.
Depois que ela expirou, mesmo com os joelhos doendo, ele ia, devagar, todos os SÁBADOS, com alguma flor colhida do jardim que ela cultivara e que lhe restara de herança, depositar em frente à lápide, e dizer-lhe, ainda, “eu te amo”.
O que lhe restava de vida, era para aguardar o momento de juntar-se a ela, com o coração leve, sabendo que jamais perdera a oportunidade de dizer-lhe que a amava. Por toda a sua vida, ele soube ama-la de domingo a domingo. 

Luís Augusto Menna Barreto

10.11.2019

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

As Bruxas de Gual Dídimo - uma crítica desautorizada

As Bruxas de Gual Dídimo

Eu chorava quando via o Papai Noel. 
Era frustrante para minha mãe. Lá por meus cinco, seis anos, perto do Natal, o pai levava todos nós para algumas compras e passear nas lojas no centro de Porto Alegre, num tempo em que não haviam shoppings. Então, íamos na Loja Renner e na Mesbla, uma em cada esquina, frente a frente na Rua Dr. Flores, ou no Hipo Incosul, também na Rua Dr. Flores, na esquina de baixo. Eram lojas que ocupavam prédios inteiros. Eu achava o máximo entrar no elevador, com ascensorista, e ouvir as palavras rápidas, decoradas: “2º andar, cama, mesa, banho… 3º andar, moda masculina, feminina e infantil… 4º andar, móveis, eletrodomésticos e restaurante…
Então, nessa época do ano, cada uma dessas lojas tinha o seu Papai Noel, que eu achava que ficava indo de uma para a outra. Eu meio que ficava com medo, só de olhar. A mana, não! Ela ia toda feliz falar com o Papai Noel, contava e o que queria, ganhava doces… Eu? Eu me agarrava no pescoço da mãe, berrando constrangedoramente, e a mãe, coitada, tinha de sair dali comigo; e com isso, eu ainda atrapalhava o barato da mana!
Mas hoje eu sei que aquele medo, aquele choro todo, era meu maior elogio ao Papai Noel! Eu sentia medo, porque eu acreditava. Eu realmente acreditava! E eu acreditava que, não tendo sido sempre bonzinho, não ganharia os brinquedos que tanto queria.
Na mesma medida em que fui aprendendo a desacreditar do Papai Noel, eu fui perdendo o medo. 
Eu morria de medo do bicho-papão! Um dos piores terrores de minha infância, era acordar no meio da noite. A mana, que dividia o quarto comigo, dormia tri tranqüila, e eu ali, acordado! Eu tentava tapar a cabeça com o cobertor, mas ficava com medo que, então, o bicho-papão chegasse sem eu perceber e eu levaria um susto maior ainda. Então, com olhos arregalados, eu enchia os pulmões de ar, e lá ia:
— Mãããããããããeeee… 
E, poucos segundo depois, aparecia a mãe ou o pai, com a paciência própria dos pais, para pegar-me no colo e levar-me para dormir com eles, entre eles, atrapalhando a todos. Quando a mãe estava mais cansada, ela mesma deitava um pouco na minha pequena cama, e fazia-me dormir novamente. 
Bicho-papão foi real para mim… até que fui crescendo, e desacreditando… e perdendo o medo!
Eu nem sei mais, quando foi a última vez que eu senti este tipo de medo, mas sei que foi lá atrás, em algum momento entre o desenredar-me da infância e o descobrir-me adolescente… 
Por tantas vezes, eu quis, novamente, encontrar dentro de mim aquele garoto com medo. Por tantas vezes quis reviver aqueles medos, falar com o guri assustado, descobri-lo, ainda em mim. Procuro por ele, e o espelho mostra-me cada dia mais distante, cada dia mais na direção errada. Mostra-me rugas, cabelos brancos, olhos cansados…
Então, na sexta-feira, dia 1º de novembro e no sábado, dia 2, aconteceu a mágica!
Eu estava ao lado do meu pequeno João. Estávamos no alto… e, pelo espaço de mais de uma hora, eu confesso que me perdi, perdi o tempo, e sequer sabia exatamente onde eu estava! Eu olhei para os olhinhos curiosos do João, ávidos de mundo, abertos às surpresas todas da vida, aberto a simplesmente deixar-se emocionar e vi espanto… vi sorrisos… vi sustos! Vi expressões que se somavam em uma velocidade de quem tem a pressa da vida inteira ainda… eu vi medo em seus olhinhos, alguns instantes! Então, de repente, eu olhei em minha volta, e havia uma multidão; espalhavam-se quase que amontoados em um imenso círculo e todos, absolutamente todos, comungavam das mesmas expressões do João! Eu vi sustos! Vi tensão, notei corações acelerados, mãos que se retorciam, alguns roíam os cantos dos dedos… outros pareciam querer gritar, querer avisar, mas pareciam enfeitiçados em um silêncio de quem venera, de quem está absorto, de quem está em êxtase, um transe coletivo…
… então, de repente, foi como se eu olhasse a mim mesmo e eu me senti, inarredavelmente, parte daquela comoção que a todos arrebatava. Eu me vi olhando lá pra baixo… e eu me descobri sentindo algo que há muito não sentia: eu me descobri sentindo, de novo, medo… Medo! Eu estava, de novo, ligado ao menino que chorava diante do Papai Noel, ao garoto que se escondia nas cobertas e gritava pela mãe, para que me socorresse do bicho-papão! Eu senti medo!
Lá de baixo, vinha uma energia como eu nunca havia visto em situação semelhante! Oito mulheres, lá embaixo, faziam emanar uma vibração que penetrava naquelas mais de duzentas pessoas em volta, elas gritavam, acusavam-se, ameaçavam-se, enfrentavam-se, temiam-se… Era como se elas estivessem, por magia, conduzindo a todos pelos mesmos caminhos em que estavam, pelas mesmas acusações, pelos mesmos temores… E eu senti medo!
Aquelas mulheres, não eram comuns: eram bruxas! E eu senti medo! Um medo real! E por aquela mais de uma hora, aquelas bruxas fizeram eu reencontrar o garoto que fui. Aquelas bruxas fizeram o feitiço de lembrar, experimentar e reviver meus medos e eu ser menino novamente!
Eu e meu pequeno João assistimos à peça na sexta-feira e foi impossível não voltarmos no sábado, arrependidos por não termos ido desde a quarta-feira e na quinta-feira!
A peça chama-se “As Bruxas de Salém”*. Escrita e dirigida por Gual Dídimo. Gual acertou em tudo: desde a eleição do elenco, ao iluminador; emprestou ao seu maravilhoso texto, a velocidade de um trem bala, sem nunca exigir pressa da platéia! Ave, Gual! Tão obrigado! Tão obrigado…
Obrigado Tainah Leite, Luana Oliveira, Layse Souza, Nathália Nancy, Rita Ribeiro, Mônica Moura, Kátia Menezes e Lohane Takeda!
Tainah exalava leveza na interpretação, quase flutuava, à vontade pelo palco. A veracidade que emprestava à personagem, nas variações de humor, quase assustavam, convencendo a platéia do seu poder!
Luana, de discreta participação no início, cresce muito além do seu tamanho e revela um talento e uma força de interpretação que não conseguimos compreender como tanto se agiganta!
Layse causou-me medo: olhos vidrados quando ela própria sentiu o medo da morte a assombrar-lhe e fez deste medo a energia com que furiosamente acusava!
Nathália carregou a grave responsabilidade de abrir o espetáculo em uma cena solo eminentemente corporal. Não havendo com quem dividir o peso, suportou sozinha e com louvor a pilastra sobre a qual os acontecimentos desencadearam-se!
Rita foi surpreendente. A voz macia e a placidez com que conduziu sua personagem, arrebatou a todos com o surpreendente desfecho!
Mônica parecia desafiar a si mesma. Emprestou sua frágil aparência à potência da personagem, estabelecendo o ideal contraste de quem impõe a autoridade pelo temor e não pela força!
Kátia foi além! Pontuava as cenas com o cinismo que a personagem exigia. Queria ver-se e ser vista sofrida, mas exigia que reconhecessem sua força. Segura do primeiro ao último momento em cena!
E, finalmente, Lohane, esteve soberba: teve a dificílima missão de destencionar o público em pinceladas de alívio com um humor que deveria ser percebido sem ser declarado, em meio à intensa dramaticidade do texto. E ela o fez com maestria!
Ofereço a vocês todo meu aplauso! Ofereço a vocês, o meu medo! Ofereço, o sorriso encantado do garoto que vocês, com o feitiço do palco, fizeram eu reencontrar.
Obrigado, bruxas... as bruxas de Gual Dídimo!

- - -

*As Bruxas de Salém,  peça teatral com dramaturgia de Gual Dídimo, foi apresentada, em segunda temporada, no Teatro Experimental Waldemar Henrique em Belém do Pará, nos dias 30 e 31 de outubro e 1º  e 2 de novembro, com casa lotada  nos quatro dias e merecida ovação da platéia em cada uma das apresentações!
NÃO PERCAM UMA TERCEIRA TEMPORADA!

Luís Augusto Menna Barreto

7.11.2019

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Os Éguas do Edyr

Os Éguas do Edyr


Um dia há alguns anos, menos de vinte, porque eu já morava aqui no Pará, em algum aeroporto, em uma conexão, eu fiquei sem ter o que ler! É, eu sei: vacilo meu!
Daí, fui até uma revistaria na área de embarque, e comecei a bisbilhotar. Um título chamou minha atenção: “Um Crime na Holanda”. Em formato de livro de bolso, avaliei bem e pensei: tenho 2 horas de viagem pela frente, mais uns 40 minutos aqui na sala de embarque… fiz aquela folhada em que as páginas passam rápidas pelo polegar, e decidi: vou levar. 
Naquele dia, fui apresentado ao inspetor Maigret. Foi meu primeiro “Simenon”. Eu confesso (envergonhado) que não o conhecia. Se gostei? Respondo dizendo que hoje eu tenho mais de 40 livros de Simenon, sendo 36 com o inspetor Maigret.
Eu me policio para variar de leitura. Então, raramente leio em seguida duas obras do mesmo autor. (Isso só faço com os gibis do Tex, que coleciono até hoje). Pra quem não sabe, Simenon é o mais profícuo escritor de romances policiais que se tem notícia. Ao ler seus livros, passeamos, tranquilos, pelas ruas de Paris, somos conduzidos pelo inspetor Maigret pelo interior da alma humana, e ficamos inevitavelmente envolvidos pela atmosfera maravilhosa que nos apresenta Simenon. Eu confesso, sem qualquer pudor, que prefiro muito mais Simenon à Agatha Cristie. Prefiro Maigret a Hercule Poirot. 
Atualmente, um autor vem “assombrando" a cena literária europeia e mundial com romances policiais, já tendo mais de uma obra transformada em filmes: Jo Nesbø, com o seu protagonista Harry Hole. Talvez vocês já o tenham lido ou visto em filme, como “O Boneco de Neve”, ou “Headhunters". Um escritor que prende a gente do começo ao fim.  Eu tenho 7 livros dele, faltando eu ler dois, ainda. 
Mas daí, eu fui na Feira Literária do Pará - FLIPA, evento da livraria FOX, em Belém! (Tá, eu também participei com “Pilha & Kadu” e “O Teatro”). Mas o fato é que foi preciso acontecer a FLIPA para eu descobrir vários autores “nossos" maravilhosos. E, quando digo “nossos”, não estou referindo-me ao Brasil como um todo, que tem autores não tão badalados, mas que são brilhantes. Outro dia haverei de falar em Tabajara Ruas, que escreve livros que a gente lê de um fôlego só (certamente tu já viste algo dele, como a série / filme Neto Perde sua Alma). 
Uma outra obra, esta não de ler de um fôlego só, mas de tirar o fôlego: “Oeste" de Alexandre Fraga. 
Estes dois, são maravilhosos, mas não são nossos. Estou falando “nossos" apropriando-me da naturalidade paraense para referir-me a autores daqui, deste distante Norte, do portão de entrada da Amazônia! (E olha que legal, uma matéria no G1, a respeito do lançamento do livro “O Teatro” - (veja aqui a matéria no G1) - classificou-me como “autor paraense” e, confesso, senti algum orgulho disso).
Na FLIPA, bisbilhotando os inúmeros estandes de livros de autores paraenses, eu me defrontei com pérolas da literatura, que eu sequer desconfiava que existiam. Eu já conhecia Inglês de Souza, quem eu considero uma espécie de “José de Alencar” da Amazônia, porque a literatura de Inglês de Souza é quase prosa… é fluida, suave, parece embalar nossa alma ao contar-nos a história, ainda que seja ela cruel e sangrenta, como, por exemplo o conto “A Quadrilha de Jacó Patachó”. Inglês de Souza está num patamar acima, daqueles que são extraclasse. Se algum dia tu, leitor, deparar-te com qualquer obra dele, não vaciles: adquire-a! Há alguns e-books de Inglês de Souza por preços inacreditáveis, como R$ 2,99! 
Também encontrei Dalcídio Jurandir, que tem obras como “Três Casas e Um Rio”, “Marajó”, e “Chove nos Campos de Cachoeira”. Dalcídio escreve com alguma melancolia, que vai tomando conta da alma e remete-nos às agruras e mazelas da vida à beira do rio… literatura imersiva. 
Foi possível encontrar, também, na FLIPA, títulos curiosos como “Armagedon na Cidade do Pará e a Polêmica Ressurreição do Egolecobra”, de Flávio Nassar, um texto burlesco e maravilhoso! Algo entre Garcia Marquez e Dias Gomes.
Mas hoje… ah… hoje eu quero apresentar-lhes outro autor. Sequer eu o conhecia. (Obrigado, FOX, pela FLIPA!). Lembram que comecei falando sobre autores estrangeiros de romances policiais (Simenon, Agatha Cristie e o atual Jo Nesbø)? Lembram que eu comentei sobre Maigret, Hercule Poirot, e Harry Hole? Pois eu gostaria, com profundo orgulho e um mea culpa por não o ter conhecido antes, de apresentar EDYR AUGUSTO PROENÇA. Eu comprei, quase por acaso, na FLIPA, o livro “Os Éguas”. Ora, com um título desses, somente poderia ser paraense, né?! Pois eu quero dizer-lhes que esta obra nada, absolutamente nada, deve a nenhum dos autores citados! 
“Os Éguas”, escrito em frases que dificilmente chegam a duas linhas, com diálogos próprios de quem escreveu muitos roteiros de teatro antes de aventurar-se ao romance, é um livro que não permite que paremos de ler! Uma trama elaborada com fina técnica de juntar pontas aparentemente soltas, um suspense que não antecipa em nada o que virá pela frente, uma escrita muito longe de algum erro piegas de ter obrigação de concertar o final (“concertar" com “c" mesmo, de entrar em acordo, de ter de combinar com o leitor o final). Edyr Augusto coloca-nos a passear pelas ruas de Belém vendo os lugares e sentindo seus cheiros e aromas. Principalmente, coloca-nos a participar da humanidade de seu protagonista, o delegado Gil, tão mais real que qualquer um dos estrangeiros citados. 
Gil é um de nós, alguém que se tornou policial menos por vocação e mais pela oportunidade do concurso público, com a segurança de salário fixo e garantido. Sofre as mazelas da corporação das polícias estaduais, tão abandonadas, com tantos vícios e algumas virtudes lutando na contramão de antigas práticas. Não tem a vocação evidente de Maigret; não tem perspicácia de Hercule Poirot; não tem a infraestrutura da polícia escandinava de Harry Hole. O delegado Gil, tem a experiência que temos, a realidade que vivemos, e as fraquezas que escondemos.
Enfim, descubra-o. Descubra Edyr Augusto Proença e seus títulos tão regionais, mas de histórias que fazem qualquer nacionalidade parar pra ler: “Pssica", "Casa de Cabas”, "Um Sol Para Cada Um”, entre outros.
“Os Éguas”! Uma obra absolutamente maravilhosa. Talvez seu protagonista somente possa ser comparado a um outro, ainda desconhecido: “Tomás”, o investigador de polícia de um romance em construção a 4 mãos (eu e Sandra Carreiro)… ah… mas isso, é pra outra crônica…!

Luís Augusto Menna Barreto

31.10.2019